Enquanto silencia sobre CG, MPPB pede e Justiça derruba ‘isolamento de acessos’ em Conde

A juíza Lessandra Nara Torres Silva, da Vara Única de Conde, deferiu parcialmente a tutela antecipada requerida pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB) para suspender efeitos de artigos do Decreto Municipal editado pela prefeita de Conde, Márcia Lucena, que dispõe sobre a instituição de barreiras sanitárias no município, com o intuito de impedir a proliferação da infecção pelo novo coronavírus (Covid-19). A decisão foi proferida nos autos de uma Ação Civil Pública ajuizada pelo MPPB, e cabe recurso da decisão.

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O decreto de Conde versa sobre: determinar a instituição de barreiras sanitárias nos acessos à cidade, via estradas e rodovias, sob a justificativa de impedir a proliferação do coronavírus (Covid-19), no período compreendido entre 17 a 21 de abril, sendo admitida nesse período que pessoas não residentes ou que ali não exerçam profissão sejam impedidas de ter acesso à cidade, à exceção de quem comprove a urgência e relevância para ingresso no local.

A partir disso, o MPPB alegou que a medida acarreta distinção entre brasileiros; bem como que não se respeitou a regra da lei federal de que tais medidas devem ser embasadas na vigilância sanitária, além do que a barreira sanitária só é possível para orientação e detecção daqueles que estejam com sintomas.

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Enquanto o MPPB buscou ajuizar ação para derrubar a medida de Conde que tem como objetivo evitar a proliferação do novo coronavírus, sequer existe informações sobre uma ação deste tipo para evitar a reabertura do comércio em Campina Grande, Areia ou Guarabira. Os prefeitos Romero Rodrigues (PSD), João Francisco (PSDB) e Marcus Diogo (PSDB) estão com passe livre para permitir uma maior circulação de pessoas nas ruas, o que contraria as orientações do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS). O que há é, por parte do MPPB juntamente com MPF e MPT, apenas uma recomendação para Romero rever a decisão de reabertura do comércio. Na região campinense, os casos dobraram em menos de 24 horas, e já foi registrado uma morte na cidade ocasionada por infecção com coronavírus.

A Região Metropolitana de João Pessoa, a qual o município condense está inserido, acumula mais de 88% dos casos de Covid-19 na Paraíba. A prefeitura registrou a movimentação de aproximadamente 10 mil veículos no último feriado. Além disso, a Capital tem 142 casos confirmados, e é de conhecimento público que somente 47% da população pessoense está em isolamento social, bem como também é sabido que os residentes da cidade se movimentam naturalmente por Conde.

Jurisprudência

Barreira em município paranaense com intuito de conter proliferação do Covid-19 (Foto: Divulgação)

Diversas cidades pelo Brasil já tomaram a mesma decisão que a prefeita Márcia Lucena. Anagé (Bahia), Balneário Arroio da Silva (Santa Catarina), Itamaracá (Pernambuco), Nova União (Minas Gerais), Itumbiara (Goiás), Delmiro Gouveia (Alagoas), Cornélio Procópio (Paraná), Teresópolis (Rio de Janeiro), Tancredo Neves (Bahia), e também o município mineiro de Mariana, que ficou conhecido pela tragédia do rompimento da barragem da Samarco.

Além dessas, pelo menos 25 cidades do Ceará anunciaram que decidiram fechar acessos por causa aumento, no Ceará. dos casos do novo coronavírus, registrou o Diário do Nordeste.

O que decidiu o STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (15) que estados e municípios podem tomar as medidas que acharem necessárias para combater o novo coronavírus, como isolamento social, fechamento do comércio e outras restrições.

Notícia do portal institucional: STF reconhece competência concorrente de estados, DF, municípios e União no combate à Covid-19

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Em sessão realizada por videoconferência, o Plenário, por unanimidade, referendou medida de Marco Aurélio

Com a decisão, os governadores e prefeitos também poderão definir os serviços essenciais que podem funcionar durante o período da pandemia. Antes, somente um decreto do presidente Jair Bolsonaro poderia fazer a definição.

A decisão da Vara de Conde

O órgão Ministerial aduziu que a prefeita Municipal de Conde, através do Decreto n° 0238/2020, determinou a instituição de barreiras sanitárias nos acessos à cidade, via estradas e rodovias, sob a justificativa de impedir a proliferação do coronavírus (Covid-19), no período compreendido entre 17 a 21 de abril, sendo admitida nesse período que pessoas não residentes ou que ali não exerçam profissão sejam impedidas de ter acesso à cidade, à exceção de quem comprove a urgência e relevância para ingresso no local. Diante dos fatos, o MPPB sustenta que a medida acarreta distinção entre brasileiros; bem como que não se respeitou a regra da lei federal de que tais medidas devem ser embasadas na vigilância sanitária, além do que a barreira sanitária só é possível para orientação e detecção daqueles que estejam com sintomas.

Ao decidir sobre o caso, a juíza Lessandra Nara Torres citou o artigo 5º, XV, da Constituição Federal, o qual estipula que é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens, sendo direito fundamental de ir e vir, ao mesmo tempo em que é vedada a distinção entre os brasileiros (artigo 12, §2º, da CF/88), o que garante a todo residente do Brasil a livre circulação em território nacional.

“Não detém o Município de competência para decretar restrições genéricas ou imprecisas de ingresso em seu território, sendo vedado o mero fechamento de seus limites, especialmente quando não possui sustentação em evidências científicas e viola o direito à locomoção, realizando distinção entre brasileiros”, ressaltou a magistrada, acrescentando que o Decreto n° 0238/2020, da prefeitura de Conde, proíbe o ingresso no Município daqueles que não residam ou não trabalham na cidade, por qualquer meio, alcançando, até mesmo, veículos particulares e transeuntes, em afronta à ordem constitucional e em descompasso com as medidas adotadas em outras localidades, bem como sem evidência científica acerca de sua conformidade ou autorização do Ministério da Saúde.

“Por conseguinte, entendo que o Município criou distinção indevida entre os nacionais (afronta ao artigo 5º, caput e XV e art. 19, III da CF/88), violando a liberdade de locomoção e auferindo tratamento diferenciado entre os residentes e trabalhadores do município em relação aos demais brasileiros, sem embasamento científico para tanto, sem que esteja configurado o estado de calamidade pública local, sem autorização do Ministério da Saúde”, destacou a juíza.

Segundo a magistrada, a restrição de entrada e saída de pessoas não guarda nenhuma pertinência com a finalidade de conter a proliferação da doença. Ela lembrou que nem mesmo em âmbito federal foi suspensa a circulação de pessoas em aeroportos, âmbitos que possuem maior aglomeração de pessoas, sendo, tão somente, adotadas medidas sanitárias. “Nesse sentido, cabe ao Judiciário intervir quando medidas discriminatórias e radicais são utilizadas sem os critérios legais e embasamentos técnicos necessários, ao arrepio da Constituição da República Federativa do Brasil, com conotações excessivas e desproporcionais, por meio de critérios imprecisos e genéricos, que podem mais agravar a situação do que beneficiá-la, já que acabará por dificultar a locomoção das pessoas e o acesso à própria saúde, tão necessária nesses tempos”, pontuou.

Apesar de considerar ilegal a restrição imposta pela prefeitura no tocante a entrada e saída de pessoas na cidade, a juíza disse ser plenamente possível a realização de barreiras sanitárias dentro dos limites territoriais municipais com a finalidade de verificar indivíduos que apresentem os sintomas da Covid-19, (com medidas como avaliação da temperatura e questionamentos de contato com casos suspeitos), procedendo-se com o devido encaminhamento à rede de saúde para que sejam adotados os protocolos envolvendo a doença, como medida necessária a evitar a propagação da doença.

Quanto ao pedido de suspensão do artigo 4° do Decreto Municipal, a juíza disse que tal pleito não merece deferimento, visto que o citado artigo dispõe sobre a possibilidade de aplicação de penalidades e responsabilidade civil e administrativa em caso de descumprimento dos dispositivos contidos no decreto, o qual poderá ser aplicado aos estabelecimentos comerciais que descumprirem as determinações que lá constam. “Por fim, esclareço que o acolhimento parcial da presente liminar não afasta a reconhecida competência da municipalidade à prática de atos de gestão destinados ao enfrentamento da crise da Covid-19, desde que necessárias e embasadas em evidências científicas, com observância das recomendações e orientações da Organização Mundial de Saúde e do Ministério da Saúde”, enfatizou.

Confira documento

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