“Imagine que você está gravando um filme à moda antiga, então você tem a imagem e o som, e eles estão em dois canais separados.”
Quando uma pessoa revive a memória traumática, ela usa os dois canais. O propranolol tem como alvo um deles — o do aspecto emocional da memória —, inibindo sua reconsolidação e suprimindo a dor.
Sob a influência do medicamento, a recordação será “salva” então pelo cérebro em sua nova versão menos emotiva.
A pesquisa dele sugere que cerca de 70% dos pacientes encontraram alívio após algumas sessões de terapia de reconsolidação.
Brunet colaborou com outros pesquisadores de transtorno do estresse pós-traumático, incluindo o especialista Roger Pitman, da Universidade de Harvard, nos EUA, no estudo do método.
Mais recentemente, ele lançou um programa na França, na sequência dos ataques terroristas em Paris e Nice, em que treinou cerca de 200 médicos na terapia para ajudar no tratamento de vítimas, testemunhas e socorristas.
Até agora, mais de 400 pessoas foram submetidas à terapia como parte do programa no país europeu.
Após os bons resultados na área de estresse pós-traumático, o médico diz que quer ampliar a aplicação do tratamento.
Em 2015, ele voltou sua pesquisa para os corações partidos e as “traições amorosas”, em parceria com Michelle Lonergan, sua ex-aluna de graduação na Universidade McGill, em Montreal.
“Se você olhar para as tragédias gregas, o que elas são? Basicamente, traições”, diz ele.
“É realmente o cerne da experiência humana.”
Um término de relacionamento complicado também pode ser tremendamente doloroso, acrescenta ele, e as pessoas podem sentir reações emocionais semelhantes às observadas em sobreviventes de traumas.
Os pacientes que eles recrutaram para o estudo não estavam sofrendo apenas de uma leve decepção amorosa. Havia casos de infidelidade. Alguns foram abandonados repentinamente por alguém que acreditavam ser um parceiro amoroso.
Eles estavam com dificuldade para lidar com a separação e, segundo Brunet, eram pessoas que “não conseguem virar a página, que não conseguem dar a volta por cima.”
“É o que as pessoas estavam dizendo constantemente a elas, o que não ajuda. Mas [seus amigos] estavam identificando o problema.”
Era como se os pacientes estivessem “presos no Dia da Marmota” — uma referência ao filme Feitiço do Tempo, de 1993, em que o personagem de Bill Murray revive o mesmo dia 2 de fevereiro repetidamente — mas, em vez disso, ficavam revivendo obsessivamente as traições dolorosas em suas mentes.
A pesquisa de Brunet e Lonergan mostrou que, assim como no caso do estresse pós-traumático, muitos pacientes que estavam sofrendo por amor sentiram alívio, alguns após uma única sessão de terapia de reconsolidação.
Após cinco sessões, quando leram em voz alta o texto que haviam escrito sobre a traição, tiveram a “impressão de que poderia ter sido escrito por outra pessoa — como a leitura de um romance”.
“Este tratamento se assemelha ao funcionamento normal da memória, como esquecemos gradualmente e viramos a página”, afirma.
Atualmente, o laboratório em que trabalha, em Montreal, está recrutando cerca de 60 pessoas que foram traídas ou sofreram alguma outra forma de decepção amorosa para um novo estudo de terapia de reconsolidação.
Brunet também espera que o escopo da terapia de reconsolidação possa ser expandido ainda mais, sendo usado para tratar fobias, dependência e luto.
“Qualquer tipo de sofrimento que emane de um evento emocional.”