Mais uma chacina aconteceu no último dia 24. Desta vez foi na cidade de Pau D’Arco, no Pará. As polícias Militar e Civil alegam que foram recebidas à bala. O secretário de Segurança Pública diz que vai apurar. Na realidade, dez camponeses foram assassinados e quatorze foram baleados pelos órgãos oficiais de segurança. Ironicamente, nenhum policial foi ferido, apesar dos armamentos apreendidos. Ou seja: não houve resistência. Numa área protegida por pistoleiros e seguranças, o que se conta é que o massacre foi uma resposta ao assassinato de um suposto pistoleiro da região que atuava em defesa dos fazendeiros. No mais, os graves conflitos existentes não eram desconhecidos de ninguém. O INCRA, o Ministério Público, o Tribunal de Justiça, a imprensa e o Governo do Estado estavam cientes das causas e possíveis consequências.

Fontes ligadas aos trabalhadores assassinados afirmam que eles já participaram, junto com a Liga dos Camponeses Pobres do Pará e Tocantins – LCP, de diversos protestos e fechamento de estradas naquela área. Todavia, não estavam ocupando terras. Estavam apenas acampados nas proximidades. Essas fontes também nos informam que o local onde foram assassinados os camponeses é conhecido como Fazenda Santa Lúcia. Um imenso latifúndio que pertenceu a um poderoso grileiro (posseiro de terras alheias) conhecido como “Norato Barbicha”, já falecido. Suas fazendas juntas somam milhares de hectares grilados e que foram herdados pela viúva. Um retrato 3 x 4 da concentração de terras no Brasil, uma das maiores do mundo. Cerca de 1% dos proprietários detém 60% das terras.

É escandaloso sabermos que depois de muitos confrontos e audiências públicas, comprovou-se que dos 800 hectares da fazenda Santa Lúcia, apenas 200 estavam legalmente liberadas pela Justiça para a família do grileiro falecido. Os demais 600 hectares são terras pertencentes ao Estado do Pará. Essas terras somente não estão produzindo nas mãos desses camponeses sem terra porque o atual Governo do Estado, comandado pelo PSDB, tem sido conivente e parceiro político da família de Nonato Barbicha naquela área. No entanto, nada justifica ou explica tamanha barbárie. É inadmissível que um Estado tão imenso quanto o Pará, coloque sua polícia para atirar em trabalhadores sem-terra, cujo “crime” é lutar para produzir e sustentar suas famílias.

Este é o país no qual estamos vivendo. Enquanto delações premiadas colocam nas portas da liberdade milionários presos por terem sido flagrados em atos ilícitos envolvendo bilhões de desvios de verbas públicas, trabalhadores são covardemente assassinados por um instrumento do Estado que deveria servir para protege-los. A luta pela terra é uma das mais dignas e justas num país de extensão continental como o nosso. São camponeses pobres, sem qualquer perspectiva na vida urbana, que desejam terra para produzir e sobreviver com essa produção. Nada mais justo. O que aconteceu em Pau D’Arco, onde cerca de 200 famílias estavam envolvidas no conflito revela o triste destino do nosso país.  Estamos, cada vez mais, criminalizando a pobreza e banalizando a bandidagem endinheirada.

Outra coisa que nos entristece. Parece que um fascismo de massas tomou conta do Brasil. As notícias vindas dos oligopólios midiáticos, comprometidos com o caos instalado após o impeachment, são assustadoras. Muito mais assustadores sãos os comentários das pessoas nos portais de notícias e nas redes sociais. Inclusive sobre esta chacina. Estamos assistindo a consagração da desumanidade coletiva. O avanço conservador no país tem feito estragos e injustiças cotidianamente. Estamos perdendo direitos conquistados em lutas do início do século XX. Estamos perdendo nossos irmãos e irmãs na luta pela sobrevivência. Estamos vivendo num país de mentira. Agora precisamos lutar contra a impunidade. Afinal, o massacre de Eldorado do Carajás já completou 21 anos e os assassinos ainda continuam impunes.