A República do ‘cocô’ e um estado de violência permanente

As coisas estão realmente muito nebulosas no que se refere a democracia brasileira. O auge do didatismo político na atualidade é pura escatologia. Uma sombra tenebrosa de violência insiste em querer pairar sobre o nosso horizonte.

O noticiário nacional tem sido forçado a usar o termo ‘cocô’ reiteradas vezes em manchetes e chamadas de TV, rádio… Não que seja um purismo evitar o termo, mas é uma metáfora que o presidente Jair Bolsonaro tem usado curiosamente para melhor definir seus sentimentos sobre assuntos importantes para o país.

Para ele, se você quiser preservar o meio ambiente, a melhor solução é fazer cocô um dia sim, um dia não. Deve ser para que aja uma redução da contaminação dos lençóis freáticos já que 55% do país ainda padece com falta de saneamento básico, de acordo com dados do Sistema Nacional de Informações sobre o Saneamento (SNIS).

Esta semana, Bolsonaro foi ao Piauí para, mais uma vez, destratar agentes políticos de partidos de esquerda do Nordeste. Classificou-os como ‘cocô’. Parece piada, mas é uma fala que preocupa.

Se pensarmos bem, o cocô é o resultado de um processo digestivo, que é expelido para fora do nosso corpo. Após, ele é dispensado, extirpado.

Se esquerdistas são um cocô, isso quer dizer que eles devem ser expelidos, extintos? O que seria do Estado Democrático de Direito sem a presença de agentes políticos fora do espectro ideológico do que pensa o presidente?

A declaração foi dita descontraidamente para camuflar mais um ataque à nossa democracia. É violência. Bolsonaro não foi eleito por 100% dos brasileiros, mas é presidente de todos e todas. É preciso se cobrar respeito ao contraditório.

Violência escatológica à parte, jornalistas foram também alvos de ‘brincadeira’ do presidente. Se excesso de informação fosse crime, maioria dos jornalistas estaria presa. Se isso não for considerado como intimidação, eu não sei o que é.

Também penso que declarações como esta são violências políticas que atentam contra as liberdades, seja de imprensa ou de qualquer tipo de expressão. Outro fato que acende o sinal de alerta, mais uma vez, sobre o atual estado que estamos vivemos, foi o ocorrido nesta quinta-feira (15), no escritório do ex-governador Ricardo Coutinho (PSB), uma das vozes críticas contra o avanço do golpe consolidado pelo impeachment de Dilma Rousseff e o atual governo de Bolsonaro.

Até o momento, o que se sabe é que uma pessoa, encapuzada e usando luvas, arrombou o local, vasculhou gavetas e roubou um computador. O invasor fez toda esta ação por, aproximadamente, 1 hora e 30 minutos.

Vamos fazer um exercício: um ladrão comum ficaria tanto tempo e levaria apenas um computador? Passaria mais de uma hora revirando gavetas? Estaria em busca de bens ou de algo que pudesse incriminar o ex-governador? Quantos ladrões comuns têm o hábito de usar luvas?

Não esqueçamos que um dos regimes que mais inspiram o presidente foi o militar, aquele que Bolsonaro soltou aquela frase absurda: o erro da ditadura foi torturar e não matar.

O que resta é um temor de que tempos mais recessivos e excludentes estão por vir. Lutemos para que não.