No Brasil, coronavírus é mais letal entre pretos e pardos, diz estudo

Levantamento mostra que quase 55% dos pretos e pardos morreram de Covid-19 enquanto que, entre os brancos, esse valor ficou em 38%

A Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, tem se mostrado mais letal entre negros do que entre brancos, segundo estudo divulgado pela PUC-Rio.

O Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (NOIS), liderado pelo Departamento de Engenharia Industrial do Centro Técnico Científico da PUC-Rio, analisou as taxas de letalidade da doença no Brasil conforme as variáveis demográficas e socioeconômicas da população.

Com dados sobre o coronavírus atualizados até 18/05/2020, a equipe de pesquisadores avaliou cerca de 30 mil casos graves das notificações para o novo coronavírus, disponibilizados pelo Ministério da Saúde. O resultado do levantamento mostra que quase 55% dos pretos e pardos morreram de Covid-19 enquanto que, entre os brancos, esse valor ficou em 38%.

De acordo com o coordenador do NOIS, Silvio Hamacher, a progressão dos casos confirmados da Covid-19 no Brasil tem sido influenciada também pelos fatores socioeconômicos, além da dinâmica de contágio do novo coronavírus:

— A letalidade em pretos e pardos sempre é superior à dos brancos, mesmo analisando pacientes da mesma faixa etária ou do mesmo nível de escolaridade. Isso demonstra que a taxa de letalidade do Brasil é influenciada pelas desigualdades no acesso ao tratamento — conclui.

Quanto maior a escolaridade, menor a letalidade

O núcleo reuniu todos os dados disponíveis de internação, raça e escolaridade, e as diferenças sociais acompanharam as taxas de letalidade.

As chances de morte de um paciente preto ou pardo sem escolaridade (76%) são quase quatro vezes maiores que um paciente branco com nível superior (19,6%). Quando analisados na mesma faixa de escolaridade, pretos e pardos apresentaram proporção de óbitos, em média, 37% maior do que brancos.

Entre os brancos de nível superior, 80,35% se recuperaram e 19,65% morreram. Entre os pretos e pardos sem escolaridade, 23,96% se recuperaram e 76,04% morreram.

O levantamento mostra ainda que pessoas brancas e sem escolaridade têm uma proporção de óbitos de 48% na enfermaria e 71% na UTI. Pretos e pardos, com a mesma escolaridade, têm 69% e 87%, respectivamente.

Para pessoas com ensino superior, a diferença é ainda maior: o percentual de óbitos de pretos e pardos é maior que o dobro da de brancos na enfermaria (17% contra 7%) e quase 60% maior na UTI (63% contra 40%).

Ser negro é o segundo fator de risco mais importante depois da idade, indica estudo

Uma outra pesquisa divulgada nesta quarta pela Universidade de Cambridge compartilha resultados semelhantes. De acordo com o Departamento de Inteligência Artificial da instituição, a população mais vulnerável no Brasil “é negra e pobre”. O resultado da pesquisa mostra que as desigualdades sociais no país se refletem nos números mortos pelo vírus.

O artigo acadêmico de autoria conjunta do laboratório de pesquisa do Departamento de Medicina da Universidade de Cambridge e de um grupo de pesquisadores brasileiros mostra que o impacto da etnia como fator de risco nos casos brasileiros mostra que o Brasil se tornou um dos principais campos de batalha contra o novo coronavírus.

Para os autores, os fatores de maior risco de mortalidade entre pardos e pretos têm implicações sociais consideráveis, uma vez que esses grupos contam com menos segurança social.

O estudo concluiu que os pacientes que se identificam como pardo e preto apresentam risco significativamente maior de mortalidade do que aqueles que se identificam como branco. Segundo os autores, ser negro é o segundo fator de risco mais importante depois da idade.

Os pesquisadores sinalizam que os brasileiros na região Norte e Nordeste são mais vulneráveis à pandemia, diferente da região Centro-Sul. No entanto, a pesquisa revela que o Rio de Janeiro é ponto fora da curva, pois a composição étnica afeta o número de mortes de maneira semelhante à dos estados do Norte, embora tenha um nível de desenvolvimento socioeconômico mais alto.

Do O Globo