Convidar para entrevistas e fazer armadilha é a expressão mais vil do jornalismo

Eu poderia falar um milhão de obviedades sobre a prática do Jornalismo. E lamentar posturas profissionais. Mas penso que quem está no fogo é para se queimar. Assim como acho desprezível certas atitudes que só contribuem para a depredação deste ofício que eu tanto amo e abracei para minha vida, deve ter por aí pessoas que também me veem como mal exemplo. Acontece, nem Jesus Cristo agradou a todos.

Nos últimos oito dias, vimos um bocado de coisas. Foram deputados estadual e federal dizendo que sabiam aonde jornalistas moravam, expondo vida funcional dos profissionais da imprensa como forma de descredibilizá-los. Outra deputada que tachou um blogueiro de “jornalismo de bueiro e de esgoto”, este que fez questão de implorar solidariedade aos quatro ventos.

Achei sintomático quando no mesmo dia que ouvimos estarrecidos um programa de rádio em João Pessoa à base de acusações, berros e rouquidão, o jornalista e analista político Reinaldo Azevedo se queixar de que foi vítima de distorção em uma entrevista dada à revista Época, que o definiu como alguém que adora estar em polêmicas, possuir estilo escalafobético e fumar o “cigarro de macho” da marca Hollywood.

Para aonde estamos indo? Estou a refletir. Por enquanto, fiquem com as palavras de Reinaldo, no programa que apresenta na Band News FM, o É da Coisa:

Gente que puxou o saco das esquerdas e do PT, depois viraram Bolsonaristas. Eu, não. Se alguém encontrar um texto meu defendendo a candidatura de Bolsonaro, eu peço demissão de todos os meus trabalhos. Eu sempre disse que Bolsonaro representa uma agressão aos fundamentos daquilo que eu acredito que é o liberalismo. 

Olha, é preciso ter um pouco de decência. Eu lamento ter de falar com veículo de imprensa, que tem o dever da precisão e a precisão me custa caro. Vocês, da revista Época, que endossaram essa palhaçada, eu perdi empregos por causa da minha crítica a Bolsonaro. Teria sido fácil ceder. Eu não cedo. 

Estão em busca de um título, um troço bacana. Tem lá (na matéria) em dado momento ‘Reinaldo estilo escalafobético’… vocês não sabem o que é estilo escalafobético, não escreveriam isso. Eu aceito fazer uma comparação de estilos e de conhecimento técnico. Escalafobético é, por exemplo, o apoio que vocês dão ao Sérgio Moro. Isso é escalafobético. E não adianta vir com gracinha, porque eu adoro gracinha também. Lamentável, trabalho porco, mal feito. Mal jornalismo, imprecisão, mentira. 

Se uma coisa na qual eu não pareço é com surfista, por que se eu quisesse surfar, eu teria de fato surfado na onda da decadência do PT. Enquanto vocês da Época puxava o saco do PT, ainda que fosse outra direção, eu estava criticando o partido, porque bater em cachorro morto é fácil, como vocês fazem. Eu quero ver é bater em cachorro vivo.

Vocês da Época, entenda-se, quem dá essa linha. Evidentemente, há pessoas decentes trabalhando lá, como há em todos os lugares, mas também há pessoas indecentes em todos os lugares. 

Escreve besteira e depois tem que corrigir. ‘Ah, tá parecendo Bolsonaro, criticando’. Eu não. Eu sou pela imprensa absolutamente livre, mas quero precisão, porque eu ofereço precisão. Então não vem com conversa para cima de mim. Eu não sou um trânsfuga, que é aquele que percebe que o barco vira, ele muda de lado. Eu fui crítico do petismo quando o petismo parecia mais eterno do que os diamantes e fui crítico de primeira hora do bolsonarismo porque achei que não ia dar certo com esses valores ou pelo menos com aquilo que se faz até agora. 

Parem de perseguir só o título, parem de perseguir coisinha só de internet, parem de perseguir só reprodução e retuítes. Busquem precisão, busquem informação. Tenha coragem de publicar algum dia nessa revista que o Lula foi condenado sem prova, por exemplo. Tenha coragem de publicar que a prisão do Temer é ilegal. Parem de ficar de joelhos para a Lava Jato. Parem de endossar esse momento de caça às bruxas. Sabem quem foi que ajudou a eleger Bolsonaro? Vocês. Eu, não. Desde de sempre ataquei as agressões ao Estado de Direito em curso. 

E atenção: a tática de convidar as pessoas para dar entrevistas e colocá-las em armadilha é a expressão mais vil e mais desprezível do jornalismo. Somos de igrejas diferentes, sem dúvida. Mas achei que havia pelo menos uma ética profissional na relação.

Ao se comportar deste jeito, vocês só contribuem pra rebaixar a qualidade da nossa profissão. Porque a leitura que se faz é o seguinte: se faz isso até com quem é da própria profissão, imagina com os outros. Eu lia a Época, a partir de agora não vou ler mais. Aquilo que tá lá é uma mentira. Simples assim. Fruto de uma mistura de má fé, com desconhecimento e com busca de repercussão a qualquer custo.