Você abre mão da privacidade por diversão? É isso o que muitos apps pedem

Em paralelo ao sucesso do jogo de realidade aumentada Pokémon GO, recém-chegado ao Brasil, nasceu uma teoria da conspiração de que o aplicativo estaria sendo usado para espionar os jogadores a mando da própria CIA (Agência de Inteligência do governo norte-americano). Isso é verdade? Pouco provável, o game não faz nada muito diferente de muitos outros aplicativos. Ainda assim, a questão levanta uma importante discussão: até que ponto vale abrir mão da privacidade?

A diversão compensa os riscos? Qual pode ser o preço a ser pago num futuro não tão distante assim?

Como explica Robert Muggah, diretor de pesquisa do Instituto Igarapé, a privacidade é uma das vítimas da era digital –facilitada pela penetração massiva da internet e dos telefones móveis.

Segundo ele, as mais variadas informações sobre cada pessoa são coletadas por governos e empresas. “Em alguns casos, os dados são oferecidos voluntariamente. Em outros, eles são coletados em silêncio, sem o conhecimento ou consentimento dos usuários.” Portanto, como Muggaho alerta, o Pokémon Go não é nem de longe o único vilão da privacidade. Todas as aplicações Android e iOS –gratuitas ou não – recolhem dados sobre seus usuários.

O próprio Facebook, com mais de 105 milhões de usuários no Brasil, é muito mais invasivo do que o game de realidade virtual. Além da localização e do acesso à câmera –como o Pokémon Go–, a rede social capta a lista de contatos e o número do celular.

“Para que o Facebook, por exemplo, precisa ter acesso a sua lista de contatos ou mesmo a sua localização?”, questiona Demi Getschko, conselheiro do  CGI.br (Comitê Gestor da Internet no Brasil).

Foi o caso do Pokémon GO, que, na sua primeira versão, em julho, pedia autorização para uma quantidade imensa de informações que nada tinham a ver com o funcionamento do game. Se a ausência da câmera e do GPS poderia inviabilizar o desenrolar do jogo, mensagens de e-mail e basicamente tudo que estivesse associado à conta Google do usuário extrapolavam o limite do aceitável.

Após diversas contestações, a produtora disse se tratar de um erro e lançou uma atualização com permissões bem mais restritas.

Usuários precisam se conscientizar dos riscos

O problema não está única e exclusivamente nas fabricantes, mas também na falta de cuidado dos usuários, como aponta Getschko. A maioria, de acordo com ele, nem ao menos lê os termos de uso dos aplicativos. “Por ingenuidade ou até mesmo por preguiça, eles acabam entregando a alma para os desenvolvedores sem saber. Há também aqueles que pensam: não custa nada entregar isso ou aquilo. Será mesmo?”, acrescentou.

Uma pesquisa, realizada pela empresa de segurança digital Kaspersky, revelou que 2 em cada 5 brasileiros abrem mão da privacidade ao instalar um novo aplicativo no smartphone. No Brasil, quase 40% dos consumidores não ligam para o contrato de licença do aplicativo ao instalá-lo no celular.

O estudo mostra ainda que cerca de 15% dos entrevistados nem ao menos leem as mensagens de instalação desses programas.

Apesar de as lojas oficiais de aplicativos –Google Play e App Store– serem cada vez mais rigorosas em relação à violação de privacidade dos usuários, segundo Muggah, há ainda muitos apps (especialmente aqueles que são produzidos na China) conhecidos por incluir programas maliciosos em seus códigos para coletar dados dos usuários sem o consentimento deles.

Até as aplicações aparentemente inofensivas podem colocar a sua privacidade em risco, conforme estudo da universidade americana Carnegie Mellon. Basta instalar o app para dar o desenvolvedor a permissão de administrador do seu celular, o que o dará acesso a tudo, inclusive a sua conta bancária. Já parou para pensar nisso?

“As pessoas estão dispostas a desistir dos dados pessoais em troca de um serviço. Esta é uma transação que é tão antiga quanto à própria humanidade. O que é menos compreendido são os ‘custos ocultos’ que a troca de informações pode causar”, alerta o diretor de pesquisa do Instituto Igarapé.  “Neste sentido, é uma análise custo-benefício simples.” As informações são do Uol.