Uns sentem a esperança que vem com a chuva, outros apenas se banham

Temos tanto que somos pouco agradecidos. Já parou para pensar sobre isso? Não estou aqui para medir osdireitos conquistados ou a conta bancária no final do mês, mas, sim, para falar sobre outra coisa mais sutil que, por muitas vezes, deixamos passar despercebido a chuva.

Como uma boa sertaneja, se tem uma coisa a qualaprendemos desde criança é sobre como os dias cinzentos são bem-vindos, são nesses dias em que se revela a esperança do sertanejo.

Se eu te perguntasse qual foi o maior tempo em que ficou sem ver uma gota de água cair do céu, tenho certa facilidade em afirmar que terá dificuldade de lembrar. Não porque faz tempo, mas porque não é algo que faz tanta diferença na sua vida e, se fizer, é pelo friozinho gostoso embaixo das cobertas, ou dos xingamentos aos carros que te banharam de água com lama. Mas não… não, porque estava cinza de esperança ou um “céu bonito para chover”.

Dia desses, relembrei de uma foto que havia postado,dois anos, de um casamento para o qual havíamos sido convidados, lá em Cajazeiras, a penúltima cidade do interior da Paraíba, a 487 km da capital João Pessoa, quase divisa com o Ceará. Era um verdadeiro casamento deinterior, o famoso casamentoraiz; sem muito luxo, mas regado de muito amor e reencontro de todas as famílias.

A noiva com um vestido bem bufante, com luvas – mesmo estando um calor miserável; um cantor de brega, mais para lá do que para cá e comida… MUITA comida, meus caros, afinal, casamento é sinal de fartura! E se tem uma coisa que gente do sítio gosta é de te receber com tudo que eles colhem.

Lembro que, após a cerimônia na igreja, fomos para uma casa de recepção que ficava atrás de um clube, que tem vista para uma parte do cartão postal da cidade, o Açude Grande. Já estávamos todos bem aconchegados, convidados, família, o Zezo (falsificado) dos teclados e só faltavam os noivos. Pois bem, um pouco antes deles adentrarem, as pessoas começaram a se levantar, falar entre si, com caras de incrédulos e eu de costas demorei a perceber o que estava chegando, até que alguém gritou: É CHUVA, ZÉ! É CHUVA!  

Aplausos misturados com choros de alegria, risos frouxos; foi quando eu notei que os noivos entraram e se juntaram a todos que estavam na chuva também. Eles estavam sendo abençoados, me disseram. Há quase um ano não se via água caindo do céu e olhe que estávamos em dezembro, e nesse mês é raro se ver água.

Foto: Francisco França

Os rios secos, o gado morrendo, a comida acabando, a terra rachando, mas nesse dia, não. Nesse dia, os céus abençoaram quem teve esperança de plantar, porque sabiam que iriam colher. De repente, se foi embora a aflição, a chuva molhou a terra seca, o que era cinza foi ficando verde e quem pegava na enxada estava replantando a esperança.  

Chuva é sinônimo de coisa boa, é a água que lava tudo que não se faz mais necessário, seja lá no plantio, seja dentro da gente. Água é renovação, é esperança que após todo aquele toró, coisas boas hão de vir. E se tem uma coisa que sertanejo tem de sobra é a tal da esperança. Iniciar o plantio à espera da chuva, porque ele sabe que demora meses, anos, mas um dia ela há de chegar, trazendo as boas novas.