Um concerto para a história

Os quatrocentos e trinta e dois anos da Paraíba serão marcados por muitas obras e ações administrativas. No entanto, podemos dizer que apenas um momento desta comemoração irá conversar diretamente com a alma paraibana. O Concerto da Orquestra Sinfônica da Paraíba com as cantoras e compositoras Cátia de França e Nathalia Belar revelam a força da música e o poder da renovação da arte paraibana. Cátia de França é reconhecida no país inteiro pela originalidade das suas composições.  Suas canções fazem um diálogo direto com a literatura, desde os tempos de “Vinte Palavras Girando ao Redor do Sol” e “Estilhaços”.  Nathalia Belar ainda está pavimentando seus caminhos. Mas, já começa a receber um reconhecimento do público e da crítica pela performance no palco e pela sua forma singular de interpretação.

Conheço bem as duas. Cátia de França há muito tempo. Lembro que em 1978, no antigo Teatro Leopoldina, em Porto Alegre, fui assistir o show de lançamento do LP Avohay. Mal sabia que estaria vivendo um momento histórico. Depois de quarenta anos as músicas lançadas por Zé Ramalho naquela noite se tornaram clássicos da música brasileira. No palco, Pedro Osmar tocando viola e Cátia de França tocando sanfona. Outra coincidência. Anos depois, ambos se tornaram meus amigos. Logo do show no Leopoldina depois conheci o trabalho individual de Cátia de França. Sua pujança criativa chamava encantava. Na época escutei muitas vezes suas canções nas rádios de Porto Alegre, onde morava. A força da música nordestina sempre seduziu os gaúchos.

Para esta noite do dia 5 de agosto, no Teatro Pedra do Reino os espetáculos são muitos. A começar pela beleza e pelo conforto de um dos maiores teatros do Brasil. O governador Ricardo Coutinho concebeu o Teatro Pedra do Reino em homenagem ao grande paraibano que foi Ariano Suassuna. Segundo seu filho, o artista plástico Manuel Dantas, foi emocionante para a família ver o artista sendo homenageado pela sua obra. Também é uma demonstração de força da cultura paraibana a presença da Orquestra Sinfônica da Paraíba, uma das mais importantes do país e que sempre se renova, mostrando o vigor de uma estrutura erudita no diálogo com a música popular. No comando do maestro Luiz Carlos Durier, a OSPB é sempre um espetáculo. Seus concertos de calendário sempre recebem um público consagrador.

Nathalia Belar vem surgindo como um furacão. Revela seu canto em pequenos espaços como a Budega Arte Café, no Bancários. Levou o público ao delírio cantando Velha Roupa Colorida no tributo que o Governo do Estado da Paraíba prestou ao grande poeta da música brasileira, Belchior. Representa a força de muitas outras jovens cantoras. Como Gabriela Grisi, Manu Lima, Débora Malacar, Lucy Alves, Gabriela Vilar, Regina Limeira e tantas vozes femininas de jovens artistas que iluminam a cena paraibana. Simpática, amável, poética, sensível. No palco Nathalia solta os bichos. Transforma-se e transforma tudo ao redor. Cada pequeno momento é um grande espetáculo para esta cantora que conquista seus espaços sem dever favores.

Cátia de França, Nathália Belar e a Orquestra Sinfônica da Paraíba colocadas num dos melhores palcos deste país é um tributo aos paraibanos. Uma entrega sensível no infinito tear das deusas. Duas mulheres fantásticas e uma orquestra magnífica. Um reordenamento de ordens no momento em que a cultura do entretenimento sufoca as melhores vertentes da cultura do povo. No momento em que o forró se movimenta em defesa dos seus espaços. Nathalia Belar e Cátia de França representam o que há de melhor, mais verdadeiro e mais sofisticado na representação cultural de um estado que desponta no cenário nacional como uma das maiores refinarias culturais do país. Essa junção dos melhores músicos e das grandes artistas que são Cátia e Nathalia, também alerta sobre o ostracismo em que paraibanos importantes como Cassiano, jogados pela distorção dos olhares modernosos. O concerto do dia 5 garante fortes emoções e um imenso prazer estético.