Sistema cicloviário deve demorar até 18 meses para ser implantado em João Pessoa

A mobilidade nas grandes cidades – que passa por falta de integração entre os diversos meios de transporte e prioridade ao uso de carros – urge por um planejamento que identifique as potencialidades de cada localidade. Em João Pessoa, um plano de mobilidade que tem, dentre os objetivos, a implantação de um sistema cicloviário, só deverá ficar pronto em até 18 meses – postergando ainda mais o sonho de uma cidade integrada.

Dentre os gargalos identificados pela Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de João Pessoa (Semob) no tocante às ciclofaixas e ciclovias, estão a descontinuidade dos trechos e a segregação em relação ao transporte público. “Não há uma malha única e a gente precisa fazer essa ligação. A ciclovia da Beira Rio vai ser a primeira a ligar o centro à praia. As outras têm que seguir esse conceito de integração, sendo alinhadas às rotas de transporte coletivo”, comentou o diretor de planejamento da Semob, Adalberto Araújo.

O plano de mobilidade que será desenhado pelo órgão e que vai trazer um sistema cicloviário ainda está em processo de licitação da proposta técnica. “Ele precisa de pesquisa para indicação de novas rotas e integração com outros sistemas. Vamos pensar dentro dessa nova política de mobilidade urbana, ligando o sistema cicloviário aos terminais e aos principais corredores”, afirmou.

Além de pesquisa, o plano será desenvolvido com a participação pública, por meio de discussão com a sociedade organizada e entidades de classe, a exemplo de comerciários, setor hoteleiro e turístico, entre outros. “É um processo demorado. Todos vão entrar na discussão com o objetivo de identificar a necessidade de deslocamento na cidade”, afirmou Araújo. A discussão deverá ter início a partir do segundo semestre deste ano. “Essa nova política prioriza o lado humano, considerando o carro apenas como instrumento. A cidade deve ser das pessoas”, disse.

O diretor de planejamento da Semob comentou que a integração do sistema viário, dentre outras melhorias, tornaria o transporte público    atraente. “As pessoas não andam de transporte público porque o sistema não é eficiente, mas se colocar uma rota acessível, ar condicionado e sistema viário integrado, no qual não haja perda de tempo, é possível deixar o ônibus atrativo como em outras cidades. Se for priorizar o individual, os trabalhadores não são contemplados. Algumas cidades estão entrando em colapso e isso porque adotamos o sistema errado. Precisamos de uma nova política de mobilidade urbana. É tarde, mas ainda dá para reverter”, argumentou.

Coletivo em prol da “bike”
O cicloativista Caio Henrique integra o coletivo Cidade Bike, que foi lançado em 2015 com a proposta de fomentar o uso da bicicleta em João Pessoa. Dessa forma, o grupo também discute inevitavelmente acerca da mobilidade urbana na cidade. “A malha cicloviária de João Pessoa, como um todo, ainda é bastante deficiente. De um lado temos a maior parte da estrutura concentrada em regiões que não atendem prioritariamente quem utiliza a bicicleta como transporte. Por outro lado, ela possui graves problemas estruturais, relacionados principalmente à falta de conexão e acessibilidade”, argumentou.

Atualmente, a capital possui uma malha cicloviária de 40.7 km, que corresponde a 1,99% da malha total da cidade. “Enquanto que a malha cicloviária total no Brasil mais do que dobrou de tamanho nos últimos três anos, João Pessoa se manteve com seus pouco mais de 40 quilômetros de estrutura, ficando entre as dez capitais brasileiras com menor malha cicloviária. Há pelo menos quatro anos, João Pessoa não recebe investimentos em ampliação no sistema cicloviário. Pelo contrário, a prefeitura já removeu 200 metros de ciclovia no José Américo em 2013 e, recentemente, removeu outros 500 metros de ciclofaixa em Mangabeira. Nos dois casos, para ofertar mais espaço ao transporte individual motorizado, o que fere diretamente a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), estabelecida pela Lei Federal 12.587/2012”, denunciou o cicloativista.

Dessa forma, ele frisou a importância de reverter a lógica que privilegia o sistema rodoviarista, que tem o automóvel como centro da lógica da locomoção. “Temos exemplos no mundo inteiro alertando que é preciso mudar urgentemente toda essa lógica, pois traz prejuízos sérios não só para a mobilidade urbana, mas para a economia, saúde pública, segurança pública etc. A forma como as pessoas se deslocam na cidade tem forte relação com tudo isso”, afirmou.

Por isso, dentre as reivindicações do grupo, estão políticas públicas definitivamente favoráveis aos modos ativos de deslocamento. “Pedestres e ciclistas precisam ser tratados como prioridades, não apenas com o discurso vazio. O trânsito brasileiro é um dos mais violentos do mundo e isso tem custado a vida de pelo menos 40 mil pessoas a cada ano, sem contar os sequelados”, alertou.

Além disso, o coletivo alertou que a Prefeitura de João Pessoa removeu, sem aviso prévio, 500 metros de uma ciclofaixa localizada em Mangabeira, prejudicando 1.251 ciclistas que passam pelo local diariamente. “Realizamos uma contagem de ciclistas ao longo de 14 horas no local e registramos o impressionante número de 1251 ciclistas. Um prejuízo assim não pode ser apenas ignorado. O Cidade Bike produziu uma carta aberta e entregou à Semob-JP reivindicando a devolução imediata da ciclofaixa, além de outras melhorias. O processo ainda segue e continuamos sem resposta”, disse.

Coletivo prepara relatório
O Coletivo Bike está realizando um relatório de contagem de ciclistas na cidade. “No último dia 14 de fevereiro, fizemos a contagem no cruzamento entre as avenidas Beira Rio e Rui Barbosa, na Torre. O relatório possui informações sobre a quantidade de ciclistas no trecho, linhas de desejo desses ciclistas, fluxo de ciclistas por horário, incidência de bicicletas do tipo cargueira, quantidade de mulheres pedalando, ciclistas que usam mochilas ou que levam cargas improvisadas, dentre outras. A contagem foi feita com base em uma metodologia já bastante consolidada e utilizada em outras cidades do Brasil, proposta pela Associação Transporte Ativo”, afirmou.

Até o momento, a quantidade total de ciclistas foi 561 ao longo das 14 horas de contagem (5h às 19h). O Cidade Bike deve publicar o relatório até o fim deste mês no site www.cidadebike.com.br. “Trabalhos assim são importantes para gerar dados sobre o uso da bicicleta na cidade, algo indispensável para entendermos o comportamento da demanda. A Semob-JP chegou a realizar uma contagem de ciclistas em 2013, mas não publicou o relatório final nem disponibilizou os dados, divulgando apenas o número total de ciclistas. Antes disso, para se ter ideia, a última contagem havia sido feita em 1981. O trabalho permanente de contagem de ciclistas é capaz de produzir dados significativos sobre o uso da bicicleta”, concluiu Caio Henrique.

Bicicleta para trabalhar
Os integrantes do Coletivo Bike não formam um dos vários grupos de pedais que surgiu nos últimos anos da cidade. De fato, eles utilizam a bicicleta como meio de transporte. “Essa é a forma como nos deslocamos na cidade. Embora exista uma forte e saudável utilização da bicicleta enquanto esporte, não podemos minimizá-la a um instrumento de lazer. Bicicleta é um veículo reconhecido pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e tem direito legal ao uso da via. Pela mesma lei, é dever do município promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas”, afirmou Caio Henrique.

Quem também utiliza a bicicleta para se deslocar até o trabalho é o padeiro André Rocha. Morador do bairro do Alto do Mateus, ele trabalha em uma padaria no bairro dos Estados. “Há cinco anos que vou de bicicleta para o trabalho. Antes, ia de ônibus ou moto, mas agora só vou de bicicleta por conta do esporte que já gosto e do transporte público que não funciona bem. A bicicleta é mais viável, perco menos tempo e é mais barato”, contou.

Segundo contabilizou, o padeiro economiza até R$ 130 em passagens de ônibus porque optou por ir trabalhar de bicicleta. “Isso é bom. No entanto, o medo sempre existe porque nem todos os motoristas respeitam os ciclistas. Também temos poucas avenidas com ciclofaixa e por isso tenho de andar no meio mesmo. Tem local que é difícil, como a Avenida Cruz das Armas e a João Machado. Eles têm o trânsito muito complicado”, afirmou.

Mesmo assim, ele agradeceu por nunca ter sofrido acidente algum. “Na padaria, consegui convencer mais duas pessoas a irem trabalhar de bicicleta também. Um mora no Cristo e outro no bairro das Indústrias. Acho que poderiam construir mais ciclofaixas, nos ajudariam muito. Estou ansioso para ver como vai ficar a da Beira Rio”, comentou Rocha. As informações são do Correio da Paraíba.