“Se ele for preso, caminho será pedir habeas corpus no STJ”, diz advogado de Lula

Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, o advogado Sepúlveda Pertence, 80, diz que, no caso de prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entrará imediatamente com pedido de habeas corpus no STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Pertence recebeu a Folha em seu escritório em Brasília para falar da estratégia de defesa do petista.

Ele afirma que também ingressará com recursos para rever a sua condenação pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) a 12 anos e 1 mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex.

A prisão pode ocorrer nas próximas semanas após o julgamento dos últimos recursos na segunda instância.

Pertence diz que está trabalhando de graça para o ex-presidente.

Folha – Supondo que o ex-presidente seja preso nas próximas semanas, o que vai ser feito imediatamente a isso?
Sepúlveda Pertence – Ora, quando se é preso, o que você faz? O primeiro caminho constitucional é o habeas corpus. Se alguém for preso, o caminho, não é único, mas o mais expedito, é o HC, independentemente de recurso extraordinário ou recurso especial contra o acórdão do TRF-4. E vamos enfrentar os aspectos materiais da decisão do TRF: concurso material, corrupção passiva, lavagem de dinheiro.

Esse HC (pós-prisão) é no STJ?
É. Independentemente de recurso extraordinário ou recurso especial contra o próprio acórdão do TRF.

Que avaliação o sr. faz do julgamento do habeas corpus preventivo negado pelo STJ?
Poderia o STJ avançar e recuperar a força do princípio constitucional da presunção de inocência ou da não culpabilidade, mas optou por posição conservadora. O Supremo não tornou compulsória a execução provisória da pena, apenas possibilitou que fosse determinada. É notório que a matéria hoje divide o tribunal. Prisão de alguém antes do trânsito em julgado, a meu ver, só se justifica pelos motivos similares aos da prisão preventiva. O juiz Sergio Moro, que Deus o tenha, determinou a não execução. No final de sua sentença [sobre Lula], confere a possibilidade de apelar em liberdade.

Como o ex-presidente está lidando com isso tudo?
Falei rapidamente com ele ao telefone. Estava tranquilo. Disposto a lutar, esgotar todos os meios jurídicos.

O sr. conversou com os ministros antes do julgamento no STJ ou sobre o habeas corpus preventivo que está no STF?
Não. Por ter assumido a causa, recebi agressões idiotas. Uma revista afirma que, valendo-me do que chamam de relações melífluas, tinha acampado no STF para influenciar por decisão favorável pelo HC. É mentira. Nem ministros do STJ, nem do STF; tenho amigos nos dois tribunais, mas não relações melífluas. No caso do STJ, meus companheiros, como é absolutamente normal, procuraram ministro por ministro para entregar memorial. Não pude ir porque estava em casa [ele sofreu uma queda].

Sua nora é chefe de gabinete do ministro Fux. Ele se declarou suspeito no caso de André Esteves [Pertence também é advogado do banqueiro e Fux não participou de julgamento em dezembro]. Mas ele não diz se vai se declarar impedido em eventual julgamento de habeas corpus de Lula.
Problema do ministro. No meu escritório, se o caso já está distribuído ao ministro Fux, não aceitamos a causa. Quanto à posição do ministro Fux, não posso declarar nada.

Qual sua relação com a presidente do STF, Cármen Lúcia?
Embora tenha uma relação de amizade, jamais conversei com ela [sobre Lula]. E, se conversar, será nos termos de uma advocacia decente, levando memoriais, apresentando as razões. Ela já disse que somos primos, mas é brincadeira. Eu a conheci já uma jurista respeitada.

Circulou a informação que seus honorários giravam em R$ 50 milhões no caso do Lula.
De graça [honorários]. Estamos advogando também para o José Serra e o ex-presidente José Sarney e na criação da Rede, com Marina Silva. Tudo de graça. Só não para o Aécio Neves porque havia conflito. Presidenciáveis e ex-presidentes [trabalho] de graça.

Cármen Lúcia está sendo pressionada a pautar alguma ação que leve à rediscussão da prisão após condenação em segunda instância. Uma solução seria algum ministro levar em mesa um habeas corpus e provocar a discussão?
Não sei, faz tempo que deixei o Supremo. No meu tempo, julgamento de HC não dependia de decisão do presidente. Era, simplesmente, no jargão do tribunal, “posto em mesa”.

Cármen disse que julgar o tema por causa de Lula iria apequenar o Supremo.
Não se trata de caso Lula. É tese com fundamento constitucional sobre presunção de inocência e que interessa a todos os condenados. Para evidenciar a necessidade de o Supremo decidir a questão com efeito vinculante, basta dizer que há vários cidadãos que obtiveram, em termos liminares, HC para sustar a execução provisória da pena. Quatro juízes da segunda turma, quase sistematicamente, têm deferido liminar. A divisão do STF é patente e não favorece o tribunal.

Como o sr. e Lula se conheceram?
Há quase 40 anos eu estava em casa, conhecia-o pelos jornais. Abro a porta e recebo o doutor Sigmaringa Seixas, meu amigo de longa data, com Lula, para instar-me a participar de sua defesa no dia seguinte. Tenho relações com Lula, seja antes, durante ou depois da sua passagem pela Presidência. Uma relação de amizade. Quero falar de uma angústia da qual participo, que é com ambiente de intolerância que se tem estabelecido nesses tempos de punitivismo. Seja nas assembleias, na imprensa, na conversa de botequim. Isso é o maior risco para a democracia. Passei 20 anos batalhando contra o regime autoritário. Acredito que nem nas fases mais agudas tenha havido tanta intolerância.

Há caminho para Lula participar da eleição de 2018?
Quem sou eu para achar? Conforme o desenvolvimento do caso tríplex haverá mais ou menos obstáculos à candidatura. Mas nesse aspecto não estamos constituídos.

Folha de São Paulo.