Saiba que o seu legado é maior do que tijolos e argamassas, Bruce

Tão desafiador como pular do maior bungee-jump do mundo é acionar o cursor de um documento em branco, no computador. Parece conter os mesmos níveis de adrenalina e de ansiedade provocados pelo que pode vir a ocorrer, depois que começar a pular/escrever. Recomeçar aquilo que se partiu é como ter forças de ir à academia, após alguns meses estando em casa… tão dolorido o retorno, tão maçante, tão difícil; mas, depois de certo tempo, ao que tudo indica, gratificante.

Sinceramente? Cansativo nos reerguermos, depois de tanto cair e quanto mais caímos, mais lembramos a dor e a dificuldade de levantar, mesmo assim, sempre nos levantamos. Isso lembra quando assisti a Batman Begins e ouvi, pela primeira vez, Thomas Wayne perguntar a Bruce “Why do we fall, Bruce?”. Respondi na lata “Ué, e para que diabos vou querer cair?”. Thomas, porém, tinha uma resposta melhor “So that we can learn to pick ourselves up”. Que doido, não?! Cair para aprender a levantar…

Quando somos bebês, temos o nosso primeiro desafio que é respirar fora da placenta. Na infância, caímos e levantamos, com a torcida da mãe nos chamando para ir até ela e concluirmos os passos. Na juventude, se não caímos e não nos erguemos sozinhos, implica, em teoria, mais quedas e menos equilíbrio. Já adultos, os nossos companheiros de lutas e de glórias insistem em que nos recomponhamos para prosseguir.

Quedas e eu andamos juntas, digo isso com propriedade não só porque quebrei o mesmo pé duas vezes, já machuquei esse mesmo pé mais outras oito vezes. Eu poderia achar que nasci sobre uma caveira de burro e, por conta disso, hoje em dia, cada vez que caio, mais demoro a levantar. Checo primeiro se os braços estão ok, se a coluna está em ordem, se estou sentindo minhas pernas, por fim, se consigo mexer meu pé e só assim me ergo.

A demora de erguer vem junto da desconfiança, são os calos, as feridas curadas por cima de outras tantas, entretanto o que percebo acima de tudo é que me ergo… em um tempo próprio, em um passo próprio, no momento que creio ser capaz de andar uns três a cinco passos ainda trôpega, buscando o reequilibro, com medo de continuar pisando, sabendo que essa parte já foi aprendida ainda bebê, e cá estou, mais uma vez, caminhando.

Esses infortúnios normalmente vêm acompanhados da máxima “se tiver com medo, vai com medo mesmo”. Entretanto, sabemos que não somos tão positivos assim diariamente, né?! Exige um grande esforço de recomposição e visão de nós mesmos para continuarmos. Não é simples nos fazermos fortes e sermos nossa própria companhia quando estamos caídos e, cada vez afundando mais no nosso próprio poço, mas é bom relembrarmos até onde caminhamos. Para nos enxergarmos no escuro, sentindo quem somos, é preciso ir tão fundo a ponto de nos reconhecermos ao avesso.

No avesso é possível encontrar os pontos errados da trama, rever onde a linha quebrou e por onde devemos colocar a agulha para que a falha seja só mais um passo na imensidão do tapete que vem sendo composto. Não se perde um bordado porque perdemos a linha, ao contrário, viramos o pano para sabermos por onde recomeçar.