O governador Ricardo Coutinho cumpre um ciclo político exemplar em curva histórica ascendente. O batismo de fogo ideológico aconteceu no auge da campanha por Diretas Já
nos anos 1980, da ditadura em ruínas, mas cheia de dentes. Coração de estudante no Rio de Janeiro descobre no sindicalismo uma instância viva de participação e mobilização
crítica.

De militante dos movimentos sociais ao sindicalismo nos anos 1990 na Capital onde nasceu, para assumir em 1992 no PT o primeiro mandato de vereador, ele foi além, conquistou mandato de deputado estadual e se reelegeu na Assembleia como aconteceu na Câmara de todas as lutas, foi eleito prefeito no PSB, realizou, se reelegeu prefeito
sempre o mais votado.

A população do Estado viu tudo e o levou nos braços do voto ao Palácio da Redenção, de onde governou e produziu obras materiais e intangíveis de impacto histórico. No Governo,
reeleito contra oligarquias poderosas, encerra um ciclo na condição de líder apto a disputar a Presidência da República. Ou mesmo até a nada disputar.

No domingo à noite, 22 horas, digitei “Ricardo Presidente” na caixa de diálogo do Google. A busca semântica revelou 391 mil documentos, nem tudo era campanha ou política, mas os registros estavam lá. É uma tese que sensibiliza pela força do trabalho que ele impôs como assinatura.

O governador não incentiva ações campanhistas, ao contrário. Mas lideranças nacionais fazem o registro. O que é bom para o Estado que se credencia a interlocuções
importantes.

Pátria amada

Estive no comício por eleições diretas já que aconteceu no Ponto de Cem Réis na semana passada. Fui lá e cantei o hino nacional. Acho que faz bem à cidadania cantar o hino nacional em praça pública. Ao lado de pessoas que vão às ruas construir a mentalidade política que consideram a mais justa, e fazem isso na materialidade histórica do gesto,
da atitude. Aos brados retumbantes.

Sobre o nosso hino, sempre ouvi que era muito grande, desprovido de fatos heroicos e com descrições demais e emoções de menos no que diz. Sempre entendi o contrário. Os versos “um filho que não foge à luta” e “o brado retumbante”, entre outros que falam em justiça e morte, suplantam os deitados eternamente em berço esplêndido.

Para mim, e acredito que para muitos de minha geração, o hino remete à obra do paraibano Pedro Américo, ao quadro em que o genial artista de Areia idealiza um instante
heroico da viagem para a independência. Antes de aprender a letra do hino eu já tinha o relato de Pedro Américo como síntese emotiva da nacionalidade.

Talento internacional

Sobre o quadro, conhecido como “O grito do Ipiranga”, intitulado “Independência ou morte”, entendo hoje que Pedro empreende uma cenografia do heroísmo que recorta
o sentimento de glória da conquista personificada em alguém, ou num grupo.
Há uma intenção propagandística no painel, no sentido da heroicização de alguém em evento relativo ao poder afirmativo e emblemático.

O protagonismo do Dom Pedro de Pedro Américo funciona como nas visões de Napoleão pintadas por Meissonier na batalha de Solferino, ou na vertigem equestre de
Jacques-Louis David.

Sempre que posso afirmo que Pedro Américo era um talento autêntico que conquistou o Brasil e grandes centros europeus.

O pintor paraibano graduou-se, todo mundo sabe, mas sempre é bom repetir, doutor pela Universidade de Bruxelas, mestre por Paris no ateliê de Ingres, era exímio desenhista
e pintor, escreveu romance, poesia e textos científicos e filosóficos.

Liberdade e dor

Se alguém negar a identidade autoral de um autêntico espírito livre a Pedro Américo é porque não compreendeu o voo espetacular da dramaticidade de A batalha de Avaí.

Quanto à invisível modernidade do romântico historicista eu diria que ela tripudia sobre a visão dos incautos no Tiradentes Esquartejado, notável abordagem da racionalidade
revolucionária que o iluminismo apregoa. Liberdade e dor na transfiguração do mártir. Sem sentimentalismos. Pura heroicização.

Inteligência poderosa a de Pedro que incorporou aos seus quadros referências de espaço, cor, ciência, política, propaganda, exerceu mandato de deputado, fez a conjuntura
do seu tempo.

O ato político

Sobre o ato por diretas já, foi um momento autêntico da política nacional, com cidadãos e cidadãs protagonizando manifestação histórica contra um Brasil em transe acossado por hordas corruptas.

Reproduzido de o jornal A União, edição de 26 de julho de 2017