Reportagem especial: Ricardo Coutinho ‘enterra monstros’ que ele mesmo criou

“Ricardo ‘enterra monstros’ que ele mesmo criou”. Esse é o título da matéria de capa da mais recente edição do Jornal Contraponto – um dos mais respeitados do Estado. A reportagem faz uma avaliação dos políticos que saíram derrotados das urnas com a vitória do governador Ricardo Coutinho (PSB). Veja abaixo à integra da matéria.

Ricardo ‘enterra monstros’ que ele mesmo criou

A expressiva vitória do governador Ricardo Coutinho, do PSB, sobre o senador Cássio Cunha Lima, do PSDB, com mais de 111 mil votos, foi mais emblemática do que muita gente do meio político poderia imaginar. Ricardo não apenas venceu Cássio, indiscutivelmente o maio líder político até então. A sua vitória literalmente “enterrou monstros” da política que o próprio Ricardo havia criado.

Ricardo entra para a história como o primeiro político a impor uma derrota na carreira de Cássio. O filho do ex-governador Ronaldo Cunha Lima foi preparado para ser o herdeiro de seu pai. Fluente, com um discurso empolgante, carismático, jovem e arrancando suspiros das eleitoras, Cássio pareceria ser imbatível. Pelo menos nesta sua fase da vida.

A derrota na eleição passada não diminui o brilho do Senador, mas o faz descer ao patamar dos mortais, onde ganhar e perder fazem parte do jogo.

Mas, a verdadeira derrota Ricardo impôs mesmo foi ao grupo que lhe cercava desde o início de sua carreira política e que hoje, cada um por motivos diferentes, se tornou inimigo pessoal do Governador. O grupo ficou conhecido como “Coletivo RC”.

Luciano Agra

Duas figuras de proa do Coletivo se prepararam para amargar o ostracismo. O primeiro foi o ex-vice-prefeito da gestão de Ricardo em João Pessoa – o arquiteto Luciano Agra. Depois de preterido por Ricardo para disputar a sua sucessão, Agra protagonizou um rompimento que, ao que tudo indicava, traria sérios prejuízos a Ricardo. E pode até ter trazido. Ricardo escolheu a hoje deputada eleita Estela Bezerra, à época uma ilustre desconhecida, para ser a candidata ao cargo que era a menina dos olhos de Agra.

Na eleição, amargando um desgaste causado pelos sucessivos enfrentamentos com corporações de servidores públicos e até com a Assembleia Legislativa, a candidata de Ricardo ficou em terceiro na votação do primeiro turno, à frente apenas do hoje senador eleito, José Maranhão, do PMDB.

A vitória do prefeito Luciano Cartaxo foi atribuída, inclusive, ao apoio que recebeu de Agra, num rompimento desgastante e mal explicado com o Governador. Agra passou a ser, então, o único político paraibano que, mesmo sem um único efetivo, sem qualquer teste nas urnas, era tido como se fosse dono de um curral eleitoral. Não se falava no nome de Agra para candidaturas proporcionais. Chegou a ser cogitado como vice na chapa do senador Cássio Cunha Lima.

Sem cargo em qualquer esfera – municipal ou estadual – e com todos os novos aliados fora de posições estratégicas, Agra acabará sendo lembrado como o prefeito que, arbitrariamente, destruiu a pista do Aeroclube.

Nonato Bandeira

O segundo nome desse grupo ainda está em atividade, mas não por muito tempo: é o ex-fiel escudeiro e ex-secretário de comunicação das administrações de Ricardo, e hoje vice-prefeito eleito de João Pessoa – o jornalista Nonato Bandeira.

É outro caso clássico de criatura que se vira contra o criador. Ou, como diz o provérbio chinês, “o pior inimigo é o benfeitor”. Bandeira, a exemplo de Agra, também cultivava o sonho de se tornar prefeito da Capital e se portava como o grande articulador político de Ricardo. Sem Bandeira, dificilmente Ricardo teria êxito, pela ausência da sensibilidade de um articulado pensador da política.

Na última eleição, Bandeira continuou sendo visto “soprando” no ouvido de um candidato durante os debates. Mas, desta vez, o candidato era Cássio e não Ricardo. Talvez esse tenha sido o seu maior erro. Se tivesse ficado quieto, Bandeira ainda poderia “vender” a imagem do grande responsável pelas vitórias de Ricardo. Mas preferiu assessorar Cássio, justamente o franco favorito em todas as pesquisas, com vitória assegurada no primeiro turno.

Ao derrotar Cássio, Ricardo desmistificou, também, a figura pública de Bandeira. O grande articulador e pensador de Ricardo – agora é claro – era o próprio Ricardo. Bandeira tem mandato de vice-prefeito até 2016, mas vive um isolamento dentro da Prefeitura de João Pessoa. Sem os recursos que estava acostumado a administrar, pode até tentar sair candidato a vereador. Mas será uma operação de alto risco.

Roseana Meira

Outras figuras de menor brilho também estão prestes a sumir da vida pública paraibana. É o caso da sempre polêmica ex-secretária de Saúde, Roseana Meira. Ricardo criou e o próprio Ricardo tratou de enterrar politicamente a moça, apesar de todos os seus méritos. Roseana volta para a Universidade Federal da Paraíba.

Quem também deve voltar à vida acadêmica e esquecer a política é o ex-chefe da Casa Civil e ex-amigo pessoal do Governador, o professor Lúcio Flávio Vasconcelos. Ele chegou a postar fotos no Facebook, com o filho do Governador no colo, com a legenda “aguardando as ordens do meu chefe”, numa referência carinhosa ao garoto. Dizem que Lúcio Flávio foi exonerado pelas redes sociais. Ele não tinha pretensões políticas aparentes.

Bira Pereira

O ex-amigo-irmão de Ricardo, o vereador Bira Pereira, é outro que tem prognóstico nada animador daqui para a frente. Foi eleito vereador da Capital não apenas com o apoio, mas com o empenho pessoal de Ricardo. Depois de romper com o Governador e se entrincheirar no grupo criado por Agra e Bandeira, Bira amargou uma derrota fragorosa na tentativa de se eleger deputado federal.

A ex-secretária de Finanças do Estado, Aracilba Rocha, também é carta fora do baralho. Aracilba já foi ligada ao ex-senador Ney Suassuna e fez parte da equipe de Ricardo e protagonizou um escândalo contra a administração de Ricardo na reta final da campanha. Saiu do Governo atirando e também foi derrotada na eleição para a Assembleia Legislativa.

Alexandre Urquiza

Já o ex-secretário da Transparência, Alexandre Urquiza, outro membro atuante do Coletivo de RC, já havia sumido da vida política, depois da revelação de que sua filha inscrita no Bolsa Família – um programa do Governo Federal para pessoas em situação de miséria. Voltou para as salas de aula no Instituto Federal de Educação. Sem Ricardo, ficou difícil qualquer projeção na política.

Até quem não precisava necessariamente de Ricardo acabou saindo prejudicado. Foi o caso do deputado Antônio Mineral. Foi base do Governo de Ricardo na Assembleia, mas acabou sendo seduzido pelo canto da sereia, da provável vitória de Cássio. Apostou errado e ficou sem mandato.