Pesquisador da UFPB alerta para risco de novas doenças no Brasil

Documento assinado por 25 cientistas foi publicado no periódico The Lancet, uma das revistas científicas de maior prestígio na área biomédica

O pesquisador do Departamento de Engenharia e Meio Ambiente da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Rafael Raimundo, é um dos autores de carta que alerta para risco da emergência de novas doenças no país. O documento, assinado por 25 cientistas brasileiros, foi publicado no periódico The Lancet, uma das revistas científicas de maior prestígio na área biomédica.

De acordo com os cientistas, a perda da biodiversidade, a expansão das atividades humanas em áreas de matas e florestas e o consumo de animais silvestres como recurso alimentar ou em práticas exotéricas foram alguns dos principais facilitadores de surtos recentes de doenças infecciosas, tais como ebola, Nipah e arboviroses, patógenos transmitidos por insetos.

Para os pesquisadores, no cenário brasileiro, o aumento da vulnerabilidade social e da degradação ambiental eleva o risco de infecções zoonóticas, transmitidas de um animal para os seres humanos. Assim, a emergência e a reemergência de agravos, incluindo a febre Oropouche, hantaviroses, doença de Chagas e febre amarela, são consideradas sinais de alerta.

No ponto de vista dos especialistas, a progressiva flexibilização das leis de proteção, o desmantelamento das instituições ambientais, o desrespeito às evidências científicas e os ataques às organizações de conservação do meio ambiente são fatores que contribuem para o aumento do desmatamento, uso indevido de pesticidas e comércio ilegal de animais selvagens.

“Todas essas ações representam um grande retrocesso nas políticas socioambientais, o que abre novas portas para o surgimento de zoonoses e impacta negativamente tanto a biodiversidade como a saúde pública, colocando milhões de pessoas em risco”, afirmam os autores da carta.

O fortalecimento do sistema público de saúde brasileiro, incluindo o paradigma da saúde única, que contempla a saúde humana, animal e ambiental, é apontado, no documento, como o caminho para enfrentar o problema.

Nesse sentido, os pesquisadores defendem a criação de um sistema integrado de vigilância e monitoramento de doenças silvestres, com forte colaboração intersetorial. Além disso, enfatizam a necessidade de cooperação multilateral e transfronteiriça.

Considerando a pandemia da Covid-19, infecção causada pelo novo coronavírus, os cientistas afirmam que a doença “representa um argumento irrefutável da necessidade de integrar a conservação da biodiversidade, a inclusão social e a resiliência econômica, por meio de cadeias socioprodutivas inovadoras e sustentáveis”.

“A ciência e a justiça social precisam ser aplicadas como instrumentos para a transformação da formulação de políticas ambientais e de saúde”, concluem os cientistas na carta.

Prevenção

De acordo com o pesquisador do Departamento de Engenharia e Meio Ambiente da UFPB, Rafael Raimundo, a publicação está relacionada a um projeto de síntese, de natureza multi-institucional, desenvolvido no Centro de Síntese em Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (SinBiose) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), entidade ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações para incentivo à pesquisa no Brasil.

O projeto é institucionalmente liderado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), sendo que professores da UFPB integram o grupo que coordena as ações, tanto o professor Rafael Raimundo, quanto a docente Ana Carolina Lacerda, do Departamento de Sistemática e Ecologia da UFPB.

“Esse projeto tem como objetivo compreender e prever como a convergência da degradação ambiental e vulnerabilidade social criam condições para emergência de surtos e epidemias de doenças tropicais negligenciadas”, explica o professor da UFPB.

Segundo Rafael Raimundo, a equipe trabalha com a integração de teorias ecológicas, evolutivas e socioeconômicas, dentro da abordagem One Health (Saúde Única), para combinar grandes conjuntos de dados sobre meio ambiente e desenvolvimento humano e avançar no entendimento dos processos que geram epidemias de doenças negligenciadas

Atualmente, o grupo está trabalhando em indicadores de risco epidêmico para o Brasil, buscando fomentar a formulação de políticas públicas que contribuam simultaneamente para a conservação da biodiversidade e para o desenvolvimento humano.

A carta de alerta para risco de novas doenças no país é assinada por dez pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), da Universidade de São Paulo (USP), da UFPB e do Centro para Sobrevivência de Espécies do Brasil (Center for Species Survival Brazil/IUCN-SSC).

O documento conta ainda com o apoio de 15 especialistas de instituições nacionais e internacionais, entre elas a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).