Os deuses do Olimpo certamente continuam a pregar peças na humanidade. Julgo que a evolução destas divindades está personificada naqueles que detém algum poder, quer seja político, social, econômico ou até mesmo afetivo.

Amantes do destroçar de corações e mentes para que o temor floresça, estes deuses modernos não poupam em distribuir ironias, desdém e de turbinar o cotidiano de nós, meros mortais, com joguetes sem graça aonde tentam nos impor que, apenas o que resta, é venerá-los, mesmo em situações constrangedoras, e pedir mil perdões por qualquer pensamento de resistência ou de saída do escuro da caverna. Mais uma dose? É claro que não estamos a fim.

É, estamos em desvantagem mesmo. Nós, que trabalhamos e estudamos duro a vida toda, temos direito a uma jornada cansativa, obstaculada e dispendiosa em direção ao Sol. E se você nascer preto, em comunidade periférica e depender da rede de saúde e educação pública, suas perspectivas reduzem ainda mais. Haja paciência nessa trincheira!

Ouvi que houve uma revolução na década de 30, em que um gaúcho uniu os anseios do povo contra aquele jogo entre São Paulo e Minas Gerais. Aquela política do café com leite começou bem amiga, mas todos sabem que o tempo pode corroer relações. O rodízio não estava mais dando certo e aquele revolucionário resolveu tomar o poder. Dizem que foi revolução, eu chamo de golpe. Mas isso não é assunto para agora.

Maquiavel já dizia: seja amado e temido, e, se não puder ser os dois, prefira o temor. Ele vai mais além, ao recomendar que aquele que queira ser governante de um principado qualquer deve demonstrar boas qualidades, mas que internamente deve ser racional e, acima de qualquer coisa, instintivo.

Getúlio, o revolucionário, seguiu muito bem o manual de como ser um deus… ops, governante por anos a fio, lançado lá pelos idos dos tempos iluministas. Nessa onda de ser o todo poderoso mais que perfeito da nação, criou a CLT. Getúlio, claramente, o pai dos trabalhadores, não? Mariguella que o diga.

Mas é como dizem por aí: tudo que é sólido, se desmancha no ar. A lei trabalhista, que parecia tão concreta, tão real e tão palpável por décadas e décadas, foi reformulada. Os deuses de nossa geração aprovaram uma r(d)eforma no Senado contrariando uma massa de trabalhadores que assistiu estupefata ao espetáculo.

A performance, ao vivo para quem ainda era descrente, escancarou que o humor dos deuses continua intacto. Continuam brigões, rasteiros e pouco empáticos com a agonia do povo, tal qual aquela história entre Zeus e Poseidon.

Os dois brigaram feio, porque Poseidon resolveu acorrentar o deus de todos os deuses enquanto dormia para roubar suas armas. Resultado: Zeus, como sempre, levou a melhor e o castigou, rebaixando-o ao nível dos humanos, realizando trabalho escravo em Tróia. O deus dos mares deve ter destilado muito mau humor enquanto cumpria sua pena.

Hoje, nós vimos dois paraibanos xingando um ao outro no plenário do Senado. Em um cosplay dos deuses gregos, o tucano e vice-presidente da “coisa” toda Cássio Cunha Lima e o petista Lindbergh Farias travaram uma cena desrespeitosa ao debater o leite derramado da aprovação da reforma trabalhista. Assim mesmo, sem KY gel. Prosador vs Lindinho, um toma lá, da cá deplorável e anal. Certamente, não ficará nos anais daquela Casa. Como diria Paulo Henrique Amorim: é a política da cloaca.

É isto. Os deuses continuam firmes e fortes na luta deles, que é manter viva a chama acesa da tocha do deboche, escárnio e superioridade. Nós nem sabemos para onde ir ou para qual oráculo recorrer. Na esquerda temos o Lula, o mensalão, o petrolão. Na direita, temos o Aécio, propineiro, recordista de denúncias de corrupção, e o FHC, super deus da privataria. No centro, temos o Temer, o PMDB e citá-los já basta. Será, então, que a única forma de nos livrar do humor dos deuses é nos desnudar do “amor”, devoção e ser ateu? Enquanto isso, continuarei ouvindo Juanes, entre “que ironias, las que nos da la vida mientras miles se mueren de hambre y los lideres compran arsenales y así siembran dolor” e “esto no fue el lo que tú y yo habíamos quedado de hacer ayer“. É… O contrato social foi posto para jogo para ser sistematicamente quebrado.