MP detalha como funcionava organização criminosa no futebol paraibano

Após mais de seis meses de investigação da Polícia Civil e do Ministério Público com a Operação Cartola, que mirou possíveis atos de corrupção no futebol paraibano, foi feita a primeira denúncia formal à Justiça. Na semana passada, foram indiciadas pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB) 17 pessoas, dentre dirigentes e funcionários da Federação Paraibana de Futebol (FPF), árbitros e um diretor de clube.

O MPPB, em sua denúncia, fez um resumo dos relatórios da Polícia Civil, a que o GloboEsporte.com teve acesso, e descreveu os supostos delitos que cada um dos 17 agentes do futebol paraibano cometeram.

Na denúncia, assinada pelos promotores de Justiça Rafael Lima Linhares e Octávio Neto, o MPPB explica que havia uma organização criminosa no futebol paraibano que estruturava um esquema de manipulação de resultados. O investigadores identificaram três núcleos de atividade ilícita onde estavam distribuídos os denunciados.

 (Foto: Reprodução / Ministério Público da Paraíba)

(Foto: Reprodução / Ministério Público da Paraíba)

Núcleo dos gestores e líderes

De acordo com os relatórios da Polícia Civil e a denúncia do MPPB, o primeiro núcleo era formado por sete integrantes. Seus membros ocupavam cargos de direção em clubes, tribunal desportivo e na FPF. Eram, portanto, agentes de diversas decisões importantes que definiam rumos em relação aos jogos do Campeonato Paraibano. São denunciados por constituir, financiar ou integrar organização criminosa, além de por falsidade ideológica – com exceção de Genildo Januário. Alguns também são acusados de ferir o Estatuto do Torcedor, no tocante a oferecer vantagem indevida para “alterar ou falsear o resultado de competição esportiva”.

1. Amadeu Rodrigues

Presidente eleito da FPF desde 2014, Amadeu Rodrigues é apontado pela denúncia do MPPB como o líder do esquema. Segundo o relatório, Amadeu utilizava-se de seu poder à frente da entidade que gere o futebol paraibano para atender a interesses escusos de dirigentes, como, por exemplo, na escala de arbitragem dos jogos do campeonato estadual.

O mandatário da FPF também é descrito como parcial por ter ajudado o Botafogo-PB a adulterar uma súmula do torneio deste ano, com o intuito de evitar uma eventual punição ao clube na esfera desportiva, em virtude do arremesso de objetos no campo de jogo realizado pela torcida botafoguense.

Amadeu Rodrigues é apontado pela denúncia do MPPB como o líder do esquema de manipulação de resultados (Foto: Cisco Nobre/GloboEsporte.com)

Amadeu Rodrigues é apontado pela denúncia do MPPB como o líder do esquema de manipulação de resultados (Foto: Cisco Nobre/GloboEsporte.com)

Outro fato que consta na denúncia é relacionado à influência que o dirigente teria exercido sob o Tribunal de Justiça Desportiva de Futebol da Paraíba (TJDF-PB). Segundo o MPPB, Amadeu teria conversado com o presidente do órgão, Lionaldo Santos, sobre liminares impetradas por Sousa e Botafogo-PB, discutindo quais decisões deveriam tomadas pelo tribunal.

O presidente da FPF também é denunciado por subornar membros da imprensa. Após os mandados de busca e apreensão realizados pela polícia na residência do dirigente e na sede da Federação, foi encontrado um bloco de anotações cujo conteúdo apontava pagamentos a repórteres. Em um papel apreendido estava escrito: “Passe em Marquito [Marcos Souto Maior, advogado e braço direito de Amadeu] e pegue R$ 2.000,00 com ele para pagar o repórter e guarde o troco. Veja se Marquito já tem o dinheiro”.

 (Foto: Reprodução / Ministério Público da Paraíba)

(Foto: Reprodução / Ministério Público da Paraíba)

2. Breno Morais

Atualmente vice-presidente de utebol do Botafogo-PB e homem forte deste departamento do clube desde 2007, Breno Morais é apontado pelo MPPB como um dos principais atores no suposto sistema criminoso estruturado no futebol paraibano.

De acordo com a investigação realizada na Operação Cartola, ficou constatado, segundo o MPPB e a Polícia Civil, que o dirigente botafoguense exercia seu poder dentro do clube para pressionar a Comissão Estadual de Arbitragem de Futebol da Paraíba (Ceaf-PB) com o objetivo de colocar em prática a manipulação de resultados, a fim de favorecer o Botafogo-PB.

O diretor do Belo, como mostra as escutas telefônicas a que o GloboEsporte.com teve acesso, gozava de um bom relacionamento com o então presidente da Ceaf-PB, José Renato, com quem tratava abertamente as possibilidades de escalação de árbitros para os jogos das rodadas do Paraibano.

Breno Morais ficou calado em depoimento à Polícia Civil (Foto: Reprodução / TV Cabo Branco)

Breno Morais ficou calado em depoimento à Polícia Civil (Foto: Reprodução / TV Cabo Branco)

Conforme a denúncia do MPPB, Breno Morais oferecia vantagens aos árbitros para que eles ajudassem o Belo. Em algumas escutas obtidas pela reportagem, o dirigente falava diretamente com os árbitros, cobrando favorecimento e exercendo pressão sobre eles.

A Breno ainda se imputa uma acusação relacionada à falsificação da súmula do jogo entre Botafogo-PB e CSP, realizado no dia 11 de fevereiro. De acordo com o MPPB, o documento oficial do jogo foi modificado para que o Belo não fosse prejudicado futuramente.

3. Lionaldo Santos

Presidente do TJDF-PB, Lionaldo Santos era um dos principais responsáveis por decisões jurídicas sobre a prática do futebol profissional na Paraíba. De acordo com o MPPB, “suas decisões tinham o estrito interesse de acatar os direcionamentos de Amadeu”.

A denúncia também explica que o tribunal era bastante parcial, o que resultava numa defesa aos aliados integrantes do que o MPPB chama de organização criminosa.

De acordo com o MPPB, Lionaldo atendia em seus julgamentos os interesses do presidente da FPF, Amadeu Rodrigues (Foto: Reprodução/TV Cabo Branco)

De acordo com o MPPB, Lionaldo atendia em seus julgamentos os interesses do presidente da FPF, Amadeu Rodrigues (Foto: Reprodução/TV Cabo Branco)

Outro fato investigado e que levou a investigação a concluir que havia parcialidade da conduta do presidente do TJDF-PB é que houve um apressamento para que a súmula de um jogo da primeira fase do Campeonato Paraibano deste ano, entre Treze e Botafogo-PB, em Campina Grande, fosse logo enviada para o tribunal.

O objetivo era denunciar o mais rápido possível o Galo da Borborema, clube que ele classificou, em uma das escutas a que a reportagem teve acesso, como time que estava em “guerra com a Federação”. O clube foi julgado e punido merecidamente, já que houve mesmo brigas na arquibancada entre os torcedores do clube.

4. Marinaldo Barros

Procurador geral do TJDF-PB, Marinaldo Barros tem, por força do cargo, poder de promover as denúncias que vão a julgamento no Tribunal. Em uma das escutas utilizadas para fazer a denúncia contra o procurador, Marinaldo trata com Lionaldo a respeito da possibilidade de prejudicar o Treze por demanda de Amadeu Rodrigues.

Marinaldo Barros é apontado pela denúncia como um membro parcial do TJDF-PB (Foto: Divulgação / TJD-PB)

Marinaldo Barros é apontado pela denúncia como um membro parcial do TJDF-PB (Foto: Divulgação / TJD-PB)

5. José Renato

É apontado com um dos principais agentes do esquema no tocante à manipulação de resultados. José Renato foi árbitro do quadro da CBF e da FPF e assumiu a presidência da Ceaf-PB, nomeado pelo presidente da FPF, Amadeu Rodrigues, em janeiro de 2015.

Por força de ofício, dentre outras atribuições, realizava as escalas de árbitros e fazia o sorteio delas para os jogos do Campeonato Paraibano. De acordo com o MPPB, “o denunciado foi flagrado por diversas vezes e formas manobrando os sorteios de árbitros”. Conforme a denúncia, as escalações sempre atendiam interesses dos integrantes da suposta organização criminosa, sobretudo a fim de beneficiar o Botafogo-PB.

José Renato é denunciado por ser, segundo o MPPB, um dos líderes do esquema de manipulação de resultados do Paraibano (Foto: Reprodução / TV Cabo Branco)

José Renato é denunciado por ser, segundo o MPPB, um dos líderes do esquema de manipulação de resultados do Paraibano (Foto: Reprodução / TV Cabo Branco)

6. Severino Lemos

Era o braço direito de José Renato na comissão de arbitragem, da qual também fazia parte. A denúncia diz que Severino Lemos obedecia às orientações de José Renato para manipular as escalas de arbitragem. De acordo com a investigação, Lemos sabia da suposta adulteração da súmula do jogo entre Botafogo-PB e CSP.

7. Genildo Januário

Ex-presidente do Sindicato de Árbitros da Paraíba, Genildo é o atual vice-presidente do órgão. De acordo com o MPPB, o ex-árbitro avisou para alguns investigados que estava em curso uma operação policial que mirava o futebol paraibano. Além disso, a denúncia explica que ele intercedia junto a José Renato para que árbitros do seu interesse fossem escalados para partidas do Campeonato Paraibano.

Núcleo dos supervisores

O segundo núcleo envolve parte dos árbitros paraibanos que integram o quadro estadual. Alguns, segundo o MPPB, participaram diretamente de manipulação de resultados e outros promoveram ou foram coniventes com a adulteração da súmula de uma das partidas entre Botafogo-PB e CSP, do Campeonato Paraibano de 2018. O MPPB acusa os denunciados de constituir, financiar ou integrar organização criminosa e de aceitarem vantagem indevida para manipular resultados de jogos. O quarteto de arbitragem que participou do jogo entre Botafogo-PB e CSP ainda foi indiciado por falsidade ideológica, por adulterar a súmula da partida.

8. Adeilson Carmo Sales

Árbitro da FPF desde 2014, Adeilson é acusado de ter participado da adulteração da súmula do jogo entre Botafogo-PB e CSP, quando houve o arremesso de um objeto no campo. Adeilson foi o quarto árbitro da partida.

9. Antônio Carlos Rocha (Mineiro)

Conhecido como Mineiro no meio do futebol, Antônio Carlos Rocha é um dos principais árbitros do quadro estadual. Tem recorrente dificuldade de passar em provas físicas nas avaliações de arbitragem, mas ainda assim era um dos juízes mais utilizados por José Renato na sua gestão à frente da Ceaf-PB.

É apontado na denúncia como um dos árbitros do estado que manipulava resultado em troca de propina. A investigação aponta que ele tem ligação com dirigentes do Treze e do Campinense.

10. Francisco Santiago

Membro do quadro estadual de arbitragem desde 2004, Santiago é um árbitro menos protagonista no futebol da Paraíba. Foi o dono do apito na partida entre Botafogo-PB e CSP e, segundo a denúncia, é um dos maiores responsáveis pela adulteração da súmula do jogo, com o intuito de beneficiar o Belo, amenizando o relato sobre os objetos que foram arremessados pela torcida do clube no campo do Almeidão.

Francisco Santiago apitou o jogo entre Botafogo-PB e CSP e é acusado pelo MPPB de ter adulterado a súmula do jogo (Foto: Reprodução/TV Cabo Branco)

Francisco Santiago apitou o jogo entre Botafogo-PB e CSP e é acusado pelo MPPB de ter adulterado a súmula do jogo (Foto: Reprodução/TV Cabo Branco)

11. Antônio Umbelino

Ingressou no quadro da FPF em 2003 e também é um dos árbitros de confiança de José Renato. As investigações descrevem a sua participação na manipulação de resultados de jogos durante o Campeonato Paraibano. Segundo o MPPB, Umbelino atuou em um jogo para beneficiar um clube em troca de pagamento ilícito.

12. Éder Caxias

Árbitro de futebol da FPF desde 2007 e da CBF desde 2009, Éder Caxias é também um dos principais árbitros do futebol paraibano. Apesar da pouca projeção nacional, apita há alguns anos muitos jogos importantes na Paraíba, como diversos clássicos que envolvem Botafogo-PB, Treze e Campinense. É denunciado por supostamente fazer parte da organização criminosa. Segundo o relatório, era um dos agentes que fraudavam o sorteio das escalas de árbitros.

13. João Bosco Sátiro

Árbitro da FPF desde 2007 e, desde 2009, da CBF, Bosco é um dos árbitros da Paraíba com mais jogos realizados. Já foi o principal nome da arbitragem paraibana no cenário nacional em meados de 2010, mas acabou perdendo espaço.

É denunciado pelo MPPB por ter sido citado por Breno Morais e José Renato para que apitasse jogo entre Nacional de Patos e CSP, com a ideia de ajudar a equipe do Botafogo-PB. Bosco também é apontado como um dos investigados que fraudou os sorteios das escalas de arbitragem.

Segundo o MPPB, João Bosco Sátiro apitou um jogo entre CSP e Nacional de Patos com o objetivo de atender os interesses do Belo (Foto: Silas Batista/GloboEsporte.com)

Segundo o MPPB, João Bosco Sátiro apitou um jogo entre CSP e Nacional de Patos com o objetivo de atender os interesses do Belo (Foto: Silas Batista/GloboEsporte.com)

14. José Maria de Lucena Netto

José Maria Netto é atualmente um dos auxiliares da Paraíba com maior projeção nacional, atuando com certa frequência em jogos de Série B do Campeonato Brasileiro. Integra o quadro estadual desde 2007 e o nacional da CBF desde 2010. Fez parte da arbitragem do jogo entre Botafogo-PB e CSP e é um dos indicados pelo MPPB por ter fraudado a súmula do duelo.

15. Tarcísio José de Souza (Galeguinho)

Conhecido como Galeguinho no meio da arbitragem, Tarcísio José é um árbitro assistente com pouco protagonismo no futebol paraibano. Foi cooptado algumas vezes por Zezinho do Botafogo, presidente do Botafogo-PB, e Breno Morais, vice de futebol do clube, para beneficiar o Belo no Paraibano. É denunciado por ter confirmado que iria ajudar o clube em uma das escutas analisadas pela investigação.

16. Josiel Ferreira da Silva

Árbitro auxiliar na Paraíba desde 2014, Josiel é mais um dos membros da arbitragem denunciados por fraudar a súmula da partida do Botafogo-PB contra o CSP pelo Campeonato Paraibano para não prejudicar o time da estrela vermelha. Ele atuou na partida como bandeirinha e, assim como os outros árbitros do jogo, assinou a súmula refeita e, portanto, adulterada, de acordo com a denúncia.

Núcleo da logística

Segundo a denúncia do MPPB, o terceiro núcleo da suposta organização criminosa possuía apenas um membro. Trata-se do funcionário da FPF, José Araújo da Penha. Ele está nos quadros da Federação desde os tempos em que Rosilene Gomes estava à frente da entidade e faz parte do departamento técnico, que é o que organiza as competições profissionais na Paraíba. Araújo é acuasado de fazer parte de organização criminosa e de ter falsificado ou alterado documento público.

17. José Araújo da Penha

Segundo o MPPB, Araújo intervinha diretamente em ações ligadas à manipulação dos resultados, por meio dos sorteios fraudulentos e também na articulação e cumprimento de ordens relacionadas a outros delitos. O funcionário da FPF é ainda um dos partícipes, segundo a denúncia, da adulteração da súmula da partida entre CSP e Botafogo-PB. Com informações do Globo Esporte Paraíba