Máfia italiana na Paraíba: da praia ao Brejo, confira detalhes dos investimentos da Cosa Nostra

Foto: Reprodução/MPF

A máfia italiana Cosa Nostra investiu em empresas e imóveis, ao longo dos anos, para movimentar e lavar mais de R$ 300 milhões de reais na Paraíba e no Rio Grande do Norte. O Paraíba Já teve acesso à integra da denúncia do Ministério Público Federal (MPF), nesta quarta-feira (18), no âmbito da Operação Arancia, contra 9 pessoas envolvidas no esquema criminoso internacional e constatou que o investimento na Paraíba foi de três imóveis, sendo um em Bananeiras e outros dois em Cabedelo.

No Brejo paraibano, os integrantes da Cosa Nostra Giuseppe Bruno e Giuseppe Calvaruso compraram um lote em um condomínio de luxo em Bananeiras e construíram uma casa. Em dezembro de 2019, quando Calvaruso estava no Brasil para acompanhar os negócios da máfia mais de perto, ele visitou a construção no brejo paraibano, conforme imagens que foram encontradas no telefone celular apreendido na sua prisão, posteriormente.

De acordo com a denúncia do MPF, os três italianos denunciados utilizavam empresas de fachada e “laranjas” para dissimular o lucro proveniente de crimes como o tráfico de drogas, extorsão e homicídio. Uma dessas empresas é a A & B CONSTRUCOES E INCORPORACOES LTDA, que também tinha atuação em Bananeiras e em Natal/RN.

Essa construtora, cujo sócio-administrador é Giuseppe Bruno, um dos italianos denunciados, era proprietária de dois apartamentos no Edifício Tra Mari, localizado em Intermares, em Cabedelo.

A titularidade dos dois apartamentos de Cabedelo foi transferida para a brasileira Sara da Silva Barros, que era companheira de Giuseppe Bruno e “laranja” nos negócios do marido. Ela tinha nome “limpo” na Justiça à época e os italianos decidiram que, outro empreendimento da Cosa Nostra, a pizzaria e restaurante Italys, localizada em Ponta Negra, bairro nobre de Natal/RN, deveria ser no nome de Sara. Depois, eles quiseram que ela fizesse um empréstimo no banco Sicoob.

“Porém, como ela não tinha rendimentos ou bens móveis e imóveis em seu nome para oferecer em garantia, a SICOOB teria negado inicialmente o pedido de empréstimo, oportunidade em que GIUSEPPE CALVARUSO e GIUSEPPE BRUNO transferiram para o nome de SARA DA SILVA BARROS dois apartamentos localizados no Estado da Paraíba (Cabedelo), cuja propriedade pertencia à empresa “A&B CONSTRUCÕES E INCORPORACÕES LTDA.”, a qual tem como sócio-administrador o seu então companheiro GIUSEPPE BRUNO, viabilizando, assim, o empréstimo solicitado. Trata-se, em evidência, de técnica de lavagem de capitais de transferência de ativos a terceiros com o objetivo pulverizado de afastar sua origem criminosa”, diz trecho da denúncia.

Em outro trecho da denúncia, há a transcrição de uma das conversas telefônicas via Whatsapp entre Giuseppe Bruno e Giuseppe Calvaruso em que, discutindo sobre investimentos na pizzaria de luxo em Natal, mencionam Bananeiras.

“(Giuseppe BRUNO: “Eu estava fazendo alguns cálculos além do que pagamos
para terminar o segundo andar, a escada comum e a placa, o equipamento de
cozinha e o que está faltando na pizzaria ainda precisamos de cerca de 265 mil
reais que terminamos Bananeras . … omissis …”; CALVARUSO Giuseppe:
“Completamos e abrimos o segundo andar, realizamos os trabalhos de alvenaria
no terraço e a partir dos recibos dosamos nossas forças”. Eu concordo”)”.

Entenda o caso

Ministério Público Federal (MPF) denunciou três italianos e seis brasileiros por envolvimento nos crimes de organização criminosa internacional e lavagem de dinheiro para a máfia italiana. A denúncia é resultado da Operação Arancia, que investigou uma ramificação da Cosa Nostra, uma das maiores organizações mafiosas da Itália e que comprovadamente atua no Brasil, especialmente no Rio Grande do Norte e na Paraíba. O trabalho é conduzido por uma Equipe Conjunta de Investigação (ECI), formada por autoridades brasileiras e italianas.

Segundo o MPF, as células da organização criminosa internacional instaladas no Brasil se dedicavam a diversas modalidades de lavagem de ativos. O grupo utilizava empresas de fachada e “laranjas” para dissimular o lucro proveniente de crimes como o tráfico de drogas, extorsão e homicídio.

Valores – As apurações indicam que o esquema resultou na lavagem de capital ilícito de, pelo menos, R$ 300 milhões (ou cinquenta milhões de euros) desde 2009. Segundo as autoridades italianas, entretanto, o valor total dos ativos investidos podem superar 500 milhões de euros, em valores atuais, mais de R$ 3 bilhões.

Entre os investimentos das empresas fictícias no Brasil, foram identificados um restaurante de luxo em Natal (RN), apartamentos em Cabedelo (PB), uma casa de luxo em um resort em Bananeiras (PB) e um grande loteamento residencial no município de Extremoz (RN), parcialmente financiados com lucros de tráfico de drogas e de extorsão praticados em Palermo.

Além da condenação dos envolvidos, o MPF pediu à Justiça a manutenção da prisão preventiva dos líderes da máfia. Dois deles já estão presos por outros crimes: Giuseppe Calvaruso – sob custódia na Itália – e Pietro Lagodana – que cumpre pena no Presídio Estadual de Alcaçuz, no RN. O terceiro italiano apontado como líder, Giuseppe Bruno, foi preso no Brasil durante a Operação Arancia, em agosto deste ano. Nesta terça-feira (17), a segunda turma do Tribunal Regional Federal da 5a Região (TRF5) negou pedido de Habeas Corpus, e Giuseppe Bruno segue preso aguardando julgamento. Além dos três chefes, foram denunciados seis brasileiros acusados de integrarem a organização em diferentes períodos, incluindo companheiras dos italianos.

A denúncia foi recebida pela 14a Vara da Justiça Federal no Rio Grande do Norte e tramita sob o número 0810121-29.2022.4.05.8400.

Cooperação Internacional – Deflagrada em 13 de agosto deste ano, a Operação Arancia resultou na execução do mandado de prisão preventiva de Giuseppe Bruno e cinco mandados de busca e apreensão, em três estados brasileiros: Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Piauí. Simultaneamente, a Direção Distrital Antimáfia de Palermo coordenou 21 buscas em várias regiões da Itália e na Suíça. Mais de cem agentes financeiros italianos foram mobilizados.

A Equipe Conjunta de Investigação (ECI) responsável pela operação é formada pelo MPF, Polícia Federal, Procuradoria de Palermo e pela polícia italiana, com o apoio da Agência da União Europeia para a Cooperação Judiciária Penal, Eurojust. Nessa frente, o MPF teve papel decisivo. A Secretaria de Cooperação Internacional do órgão firmou o acordo para a constituição da equipe e o Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte (MPF/RN) assumiu a coordenação do grupo juntamente com a Polícia Federal. A formação da ECI tramitou no Ministério da Justiça e está em conformidade com a Convenção de Palermo, que é o principal instrumento global de combate ao crime organizado transnacional.