Ladrão pede comida pelo celular de vítima e é preso pela polícia; lanche ficou com mulher roubada

“Roubaram meu celular, pediram Uber Eats por ele, apareceu o endereço que o ladrão estava, a polícia foi lá pegar e ainda trouxeram o pastel que ele pediu, comi com a galera da delegacia”.

O relato feito pela biomédica Daniela Tegon, 23, em uma rede social sobre crime ocorrido ainda no primeiro semestre do ano passado. Com exceção do final com pastel na delegacia e ladrão preso, histórias como essa têm se tornado comuns entre vítimas de furtos e roubos de celular.

Aproveitando-se dos aparelhos desbloqueados, os bandidos passam a fazer pedidos de banquetes que, algumas vezes, ultrapassam milhares de reais.

Daniela foi roubada por um homem armado com uma faca na avenida Paulista. “Quando cheguei em casa, estava recebendo emails no Uber Eats. O primeiro foi pedido na casa do Pão de Queijo, de uns R$ 400”, disse à Folha.

Depois disso, vieram outros pedidos, sempre para o mesmo endereço, na rua Paim, região da Consolação. Ela foi até a delegacia naquele mesmo bairro e encontrou policiais militares dispostos a ir até o lugar, bem próximo dali.

Um PM ligou para o restaurante, explicou a situação e pediu para que a encomenda aguardasse a chegada da viatura. A polícia chegou ao local ao mesmo tempo que o pedido de oito pastéis.

Um homem desceu para pegar a encomenda e acabou preso. Na delegacia, Daniela reconheceu o rapaz como sendo o ladrão.

A biomédica diz que pediu o bloqueio do aplicativo de entrega e, no final, acabou tendo o valor ressarcido.

O celular, porém, nunca mais foi encontrado, pois não havia mandado para que a polícia entrasse no apartamento.

A Folha coletou diversos relatos semelhantes com o mesmo modus operandi, em período de alta nos roubos e furtos de aparelhos. Conforme levantamento do jornal Agora, do grupo Folha, de janeiro a abril do ano passado os roubos dos aparelhos aumentaram 20% e os furtos, 37%.

O analista de recursos humanos Jeferson Oliveira Andeluz, 42, teve dois celulares levados nos últimos dois meses. Em ambas as vezes, no centro da capital, os criminosos tentaram fazer pedidos de comida.

“O cara fez uma compra de R$ 1.000 no Uber Eats, uma de R$ 200 de frango”, diz. “Ele tentou fazer outras compras no Rappi, no Ifood, e o cartão vinculado a essas contas acabou o limite. Mas tentou comprar… tipo 15 garrafas de uísque.”

No segundo roubo, conta Andeluz, o ladrão, vendo que ele não tinha saldo para novas compras, entrou na conta bancária e renegociou as dívidas. “Conseguiu até uma uma taxa de juros melhor, mas não conseguiu comprar mais nada.”

Na mesma época, o bancário Murilo Cattaneo, 24, também teve de lidar com o problema. Ele havia acabado uma corrida no Minhocão quando uma pessoa de bicicleta tomou o celular de sua mão e fugiu.

“Pediram aproximadamente R$ 1.000 em comida. Foram R$ 700 só no McDonald’s, R$ 300 em uma adega. Compraram um uísque caríssimo também”, diz.

No mesmo episódio, os ladrões furtaram R$ 10 mil de uma conta bancária e gastaram R$ 3.000 no cartão de crédito. Ele, assim como os outros entrevistados pela Folha, disse ter sido ressarcido.

A assessoria de imprensa da Secretaria da Segurança Pública encaminhou uma nota sobre este tipo de caso, embora não tenha respondido a alguns questionamentos específicos sobre este novo tipo de crime.

“A Polícia Civil orienta que as vítimas procurem qualquer delegacia para registrar o crime. No caso de furto ou roubo de celular, recomenda-se que a pessoa solicite imediatamente o bloqueio junto à operadora de telefonia e peça ao banco o cancelamento dos cartões habilitados para compras online pelos aplicativos instalados no telefone”, diz a pasta, em nota.

O coordenador Defesa Cibernética na FIAP ON, Henrique Poyatos, afirmou que, em nome da praticidade, aplicativos de entrega não costumam ter camadas de segurança como os de bancos, exigindo diversos tipos de senha, por exemplo.

“O jeito mais interessante para proteção são alguns tipos de aplicativos que colocam uma camada de extra de segurança”, afirma. “Além de encontrar o celular a distância, apagar dados no caso de furto, tem possibilidade de proteger aplicativos, incluindo a exigência de senha ou biometria quando a pessoa clica no aplicativo.”

Ele afirma que os aplicativos geralmente são pagos, ele cita como exemplo o Internet Security, da Kaspersky, que custa R$ 19,90 por ano.

Outro método, diz Poyatos, são formas de pagamento digital como Apple Pay, Google Pay ou Samsung Pay, que exigem senhas.

Como agir

A Folha questionou a Uber, iFood e Rappi sobre este tipo de crime e como o cliente deve agir. As empresas recomendam os usuários a tomarem medidas de segurançaa assim que o episódio aconteça.

A Uber afirmou que possui medidas de proteção contra fraudes. “Nos termos e condições da plataforma, é possível acessar os motivos para ajustes referentes a erros em pedidos. Se um pedido estiver todo incorreto, vamos reembolsar o cliente pelo preço total do pedido (incluindo impostos/VAT) e pelo preço de entrega”, afirma a empresa.

A empresa afirmou que, em seu site, é possíve relatar os casos e entrar em contato com a empresa. A Uber ainda confirmou ressarcimento de dois clientes citados pela Folha e disse que não conseguiu confirmar um terceiro por falta de dados.

A Ifood afirmou que a segurança é prioridade em sua atuação. De acordo com a empresa, quando ocorrer um roubo ou furto do celular, o cliente deve acessar a sessão ajuda do site da empresa e comunicar a ocorrência, além de bloquear o cartão de crédito.

“Ainda no site, na área de segurança, é possível remover todos os dispositivos conectados à conta para impedir que ela seja utilizada em compras e realizar o procedimento de alteração da senha”, diz a empresa.

A Rappi afirmou que “lamenta os transtornos causados pela violência urbana e recomenda que, em casos de roubo de celular, os usuários cancelem imediatamente o seu cartão de crédito para evitar compras na Rappi e em qualquer outro aplicativo, além de realizar um boletim de ocorrência”.