Justiça solta jovem preso após comprar pão no Jacarezinho

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro decidiu soltar o jovem Yago Corrêa de Souza, de 21 anos, preso no último domingo (6) por, supostamente, estar associado ao tráfico de drogas na Favela do Jacarezinho, na Zona Norte. O rapaz deixou a cadeia de Benfica por volta das 16h25, depois da chegada do alvará de soltura.

O g1 ouviu parentes do rapaz que afirmam que ele é inocente e que, no momento da prisão, Yago apenas tinha ido a uma padaria na favela. Imagens obtidas pela equipe de reportagem reforçam a versão da família.

A decisão pela soltura do jovem aconteceu nesta terça-feira (8) durante audiência de custódia no Presídio de Benfica, considerada a “porta de entrada” do sistema penitenciário fluminense.

Não é possível saber qual é o horário, mas no vídeo Yago aparece entrando às pressas na drogaria e com as mãos levantadas, como se estivesse se rendendo. Numa das mãos ele segura a sacola.

Em seguida, um policial com um fuzil também entra na farmácia, apontando a arma na direção de Yago. Em seguida, o jovem é levado pelo PM enquanto outras pessoas observam a cena.

Atualmente, a Favela do Jacarezinho está ocupada por forças policiais para implementação do programa Cidade Integrada, aposta do governo estadual para retomar a região do controle de uma organização criminosa.

‘Preso com um saco de pão’

Parentes e testemunhas disseram que houve um princípio de tumulto e correria na Rua Amaro Rangel, uma das vias na parte baixa da favela, com policiais empunhando fuzis. Segundo uma testemunha, Yago e outras pessoas correram para se proteger.

“Ele [Yago] passou por mim pra ir comprar o pão. De onde eu estava, tinha visão pra padaria. Na metade do caminho, teve uma correria. Ele [Yago] entrou pra farmácia. Eles [os PMs] abordaram um menino do lado de fora. Aí, entraram na farmácia, puxaram ele pela bermuda e levaram ele. Foi preso com um saco de pão”, disse uma pessoa que pediu para não ser identificada.

O relato coincide com o que dizem parentes de Yago. A irmã do jovem, Erica Corrêa, reclamou da abordagem dos PMs.

“Perdemos nosso direito de ir e vir. Nem na padaria mais podemos ir. Eu estou pedindo ajuda pra comunidade porque hoje foi com meu irmão, amanhã pode ser o filho de qualquer outra pessoa que saia pra comprar um pão, uma carne, e não sabe se vai retornar”, afirmou Erica.

Além de Yago, os PMs também apreenderam um adolescente com uma sacola com drogas. Mas parentes de Yago reforçam que ele só correu porque, no tumulto, viu os policiais armados.

“Numa correria, com policiais apontando o fuzil pra cara das pessoas, quem vai ficar na rua esperando ser baleado? Os policiais apreenderam um menor, olharam pra farmácia e arrastaram o Yago com o saco de pão na mão querendo associar o Yago ao menor apreendido”, disse Erica.

O que dizem as polícias

Em nota, a Secretaria de Estado de Polícia Militar informou que PMs do Batalhão de Choque que patrulhavam a Travessa Amaro Rangel e vielas do Jacarezinho se depararam com “dois indivíduos – um deles carregando uma bolsa – e que tentaram fugir ao avistarem os policiais“.

A corporação afirma que eles foram capturados com drogas. “Os dois indivíduos, um homem [Yago] e um adolescente, foram conduzidos à 25ª DP (Engenho Novo) para o registro da ocorrência. Nesta ação foram apreendidos 32 pinos de cocaína, 32 papelotes de skunk e 58 papelotes de maconha.”

De acordo com a Polícia Civil, a ocorrência foi registrada na 19ª DP (Tijuca) e, depois, encaminhada para a 25ª DP (Engenho Novo). A corporação acrescentou que o caso está sendo investigado.

‘Lugar errado, hora errada’

Segundo a irmã de Yago, no dia da prisão, na delegacia, policiais disseram para ela que nada foi encontrado com o jovem. E que de fato ele só teria sido preso porque correu.

“Eu conversei com os policiais e eles falaram que não pegaram ele com nada, mas ele correu. No momento que a nossa comunidade vive, uma correria, policial apontando fuzil pra todo mundo, quem não vai correr? Quem vai pagar pra ver? Pra ser mais um na estatística de crime, de bala perdida?”, questionou Erica.

Um despacho da 25ª DP desta segunda cita que policiais da delegacia conversaram “informalmente” com Yago e tiveram a impressão de que o jovem talvez estivesse “no lugar errado, na hora errada” .

Levando em conta os relatos dos policiais e informações da polícia, o delegado que analisou o caso também se manifestou pela soltura de Yago. E ainda orientou que os parentes levassem o documento com a representação na audiência de custódia do jovem.

O juiz Antonio Luiz da Fonsêca Lucchese entendeu não haver provas suficientes para manter Yago preso.

“Diante das circunstâncias em que teria se dado a prisão, sem perder de vista que aqui há evidente necessidade de que os fatos sejam mais apurados, sobretudo diante da dinâmica dos fatos, certamente faz com que se esvaia qualquer substrato para se cogitar, neste momento, de prisão cautelar, ainda mais diante da manifestação a posteriori da autoridade policial”, dizia um trecho da decisão.

Num dos vídeos obtidos pelo g1, numa padaria no Jacarezinho, às 19h34, Yago aparece de bermuda jeans e camisa do Flamengo comprando pão. A imagem mostra a atendente servido ao menos sete pães a Yago, que pega o pedido e caminha em direção à porta do estabelecimento.

A outra gravação é de câmeras de uma farmácia para onde familiares do jovem e uma testemunha contam que Yago correu ao notar uma confusão na rua envolvendo policiais militares.

Do G1.