Governo Temer quer reduzir floresta na Amazônia para agradar ruralistas

Pouco menos de um mês após o presidente Michel Temer vetar a polêmica Medida Provisória 756, que reduzia a Floresta Nacional (Flona) de Jamanxim, no Pará – e uma semana depois de oito viaturas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) terem sido queimadas na BR-163, próximo à região –, o governo cedeu à pressão de ruralistas e enviou na noite desta quinta-feira, 13, ao Congresso, um projeto de lei propondo uma diminuição da proteção da floresta.

O novo texto prevê uma mudança nos limites da Flona, levando a uma redução de 349.046 hectares. Essa área será transformada em Área de Proteção Ambiental (APA), o nível menos restritivo de unidade de conservação. A floresta passa a ter 953.613 ha.

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É um corte menor que o proposto pela MP, de 486 mil hectares, mas maior do que dizia o texto original da MP, feito pelo governo, que falava em 304 mil hectares. Cálculo feito pela ONG Imazon  apontou que se o governo conseguir reduzir a Flona Jamanxim e vender as terras ocupadas pelas regras atuais, dará um subsídio de mais de R$ 500 milhões a posseiros.

A conta considerou a possibilidade de regularização fundiária prevista na MP 759, sancionada na última terça-feira, 11, pelo presidente Temer.  O texto, apelidado por ambientalistas como “MP da Grilagem”, permite que grandes porções de áreas públicas invadidas na Amazônia sejam legalizadas. Pela lei,  podem ser cobrados de 10% a 50% da pauta de valores da terra nua do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Os pesquisadores Elis Araújo e Paulo Barreto, do Imazon, usaram esse dado em relação aos valores da terra.

Segundo eles, o valor médio de mercado para um hectare de pasto em Novo Progresso é de R$ 1.800. Já o Incra usa como preços referenciais para titulação o valor mínimo da terra nua de R$ 672,00. “Considerando esses porcentuais e a área total que será reduzida (350 mil hectares), os posseiros receberiam um subsídio entre R$ 605 milhões (96% do valor de mercado) e R$ 511 milhões (81% do valor de mercado) comparando com o valor de mercado das terras”, dizem.

Justificativa

Por meio de nota, o Ministério do Meio Ambiente disse que o objetivo do PL é resolver conflitos decorrentes desde a criação da Flona, em 2006. A justificativa também é citada no PL: “A área onde se localiza a Floresta Nacional do Jamanxim tem sido palco de recorrentes conflitos fundiários e de atividades ilegais de extração de madeira e de garimpo associados a grilagem de terra e a ausência de regramento ambiental. Com reflexos na escalada da criminalidade e da violência contra agentes públicos, sendo necessária a implantação de políticas de governo adequadas para enfrentar essas questões”.

De fato, quando a Flona foi delimitada, havia gente morando lá dentro que deveria ou ter sido indenizada ou ter tido sua propriedade retirada dos limites da unidade. De lá para cá, a situação só piorou e Jamanxim é a unidade de conservação onde mais cresceu a taxa de desmatamento.

Cálculos originais do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que balizaram o texto original da MP, porém, sugeriam que uma redução de 35 mil hectares seria o suficiente para resolver esse conflito. Para ambientalistas, a área dez vezes maior vai regularizar grileiros que chegaram ali depois da criação da Flona.

Na nota à imprensa, o ministério diz que o projeto de lei “faz parte de um conjunto de ações já em desenvolvimento que buscam estancar o desmatamento na região, diminuir os conflitos e promover o uso sustentável dos recursos florestais”. Afirma também que foi embasado em novos estudos do ICMBio.

“A criação da APA do Jamanxim tem por objetivo a proteção da diversidade biológica, disciplinamento do processo de ocupação da região, fomento ao manejo florestal sustentável e a conservação dos recursos hídricos. Estabelecida nas áreas de maior ocupação da Flona do Jamanxim, a APA poderá permitir a regularização fundiária destas áreas. A área da Flona, por sua vez, passará a atender os objetivos que motivaram sua criação, voltados para o manejo florestal sustentável, inviabilizados em função do conflito instalado”, continua a nota.

Nas últimas duas semanas, proprietários de terra da região no entorno de Jamanxim vinham promovendo bloqueios da BR-163, que liga Cuiabá a Santarém, pedindo a apresentação do PL. A promessa de PL tinha sido feita pelo próprio ministro Sarney Filho, em vídeo em que aparecia ao lado do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), na véspera do veto de Temer, de 19 de junho. No vídeo, Sarney Filho anunciava que a MP seria vetada, mas que um projeto de lei seria enviado ao Congresso nos mesmos termos.

Dias depois, porém, ele disse que foi mal interpretado, que o PL só seria enviado após parecer técnico do ICMBio, órgão responsável por gerir as unidades de conservação federais. O recuo ocorreu na sequência do anúncio por parte da Noruega de que o país vai reduzir seu financiamento ao Fundo Amazônia por conta do aumento de 60% no desmatamento da Amazônia nos últimos dois anos.

Do Estadão