Fundação do PSL pagou custos de blogueiros alvos do STF com verba partidária

Evento importado por Eduardo Bolsonaro ao Brasil como o maior congresso conservador dos EUA custou R$ 1,1 milhão à Fundação Indigo, que é mantida com dinheiro público

A Fundação Indigo, organização mantida com recursos do Fundo Partidário ligada ao PSL, bancou despesas de blogueiros bolsonaristas que são alvo do inquérito STF sobre Fake News, em evento organizado pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), em outubro do ano passado.

O fundo patrocinou hospedagem e transporte aéreo para os blogueiros e influenciadores bolsonaristas Allan dos Santos e Bernardo Küster participarem da Conferência de Ação Política Conservadora, o CPAC.

O evento, importado por Eduardo Bolsonaro ao Brasil como o maior congresso conservador dos EUA, custou R$ 1,1 milhão à Fundação Indigo, que é mantida com dinheiro público. O encontro durou dois dias e foi realizado no Hotel Transamérica, na zona sul da capital paulista.

As passagens do youtuber Bernard Küster mais hospedagem custaram R$ 8,9 mil. Já as despesas de Santos, hospedagem e passagens, custaram R$ 4.2 mil. Os dados foram obtidos pelo UOL, por meio da assessoria da própria fundação.

As fundações dos partidos são organizações que recebem dinheiro público do fundo partidário para o fomento à educação política, bem como a formulação e discussão de projetos políticos.

Allan Santos atuou no evento como uma espécie de mestre de cerimônia e entrevistou diversos palestrantes convidados por Eduardo.

Já Küster falou sobre a religião como a “última barreira contra a dominação comunista”, criticou a grande mídia e o sínodo do Vaticano sobre a Amazônia, a quem disse que “usa religião como negócio”.

A noite de abertura do CPAC Brasil contou com Eduardo Bolsonaro, que palestrou sobre “a importância do conservadorismo e os novos rumos do Brasil”.

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, falou sobre “a destruição causada pelos ideais socialistas no Brasil e no mundo”. Já a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, fez um relato sobre “a luta dos conservadores a favor de valores familiares e cristãos do país”.

Outros seguidores da ala ideológica que apoia o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ligada a Olavo de Carvalho também participaram do evento.

O presidente do PSL, Luciano Bivar, não compareceu, por já estar rompido com a família Bolsonaro na ocasião. Ele foi representado no encontro pelo vice-presidente Antonio Rueda.

Allan e Kuster foram alvo de mandados de busca e apreensão em operação deflagrada pela Polícia Federal do último dia 27, por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). Os pedidos foram feitos no âmbito do inquérito das fake news, que apura o uso de notícias falsas, ameaças e ataques contra a corte.

Allan é considerado por integrantes da CPMI das Fake News do Congresso como um dos líderes de um esquema de divulgação de notícias falsas e de ataques a adversários do presidente Jair Bolsonaro e a jornalistas, estimulado pelo Palácio do Planalto. Ele nega as acusações.

Kuster, que é ligado ao escritor Olavo de Carvalho, já chamou os ministros do STF de “demônios de preto” e também reproduziu fake news contra jornalistas.

Em nota, Küster afirmou que, durante todo o mês de outubro de 2019, esteve em Roma com sua equipe para cobrir o Sínodo da Amazônia “num projeto jornalístico independente”, e que o CPAC ocorreu exatamente na metade do mesmo mês de outubro daquele ano.

Por isso, o youtuber disse ter informado que, para participar do CPAC, “não tinha condições de pagar passagens”.

“Os responsáveis fizeram questão de que eu fosse ao CPAC, mesmo estando no exterior e tendo de retornar à Roma após o evento para continuar meu trabalho jornalístico. Portanto, tais custos incluem passagens aéreas internacionais Roma-São Paulo e São Paulo-Roma, 4 diárias no hotel do evento, alimentação e transporte”, disse.

Além disso, acrescentou que não cobrou qualquer valor para as palestras que ministrou e que não se recorda quem o convidou. Questionado se a fundação deveria bancar eventos do tipo, o youtuber respondeu que “parte da verba que vai a uma fundação partidária é obrigatoriamente para estes fins”.

“E mais: o parágrafo 6º do mesmo artigo (lei 9.096/95, art. 44, IV) diz que se a fundação NÃO utilizar a verba que lhe for destinada para os fins de educação política, a sobra deve ser revertida para outras atividades do partido. Logo, a verba seria utilizada de qualquer modo. Não há qualquer ilegalidade. Por força de lei, a verba TEM DE SER utilizada”, disse.

Küster acrescentou que “não vê motivo para que não se deva realizar eventos deste tipo, como o fazem outros partidos”. “A destinação de dinheiro de fundação de partido para os fins dispostos em Lei é legal e, sendo um evento conservador, ecoa a voz da maioria da população brasileira”, disse.

O UOL procurou Allan dos Santos por e-mail, no endereço eletrônico que consta no site do Terça Livre, mas não houve resposta até o fechamento desta reportagem. Em depoimento à CPMI das Fake News do Congresso, em novembro do ano passado, Allan negou que recebesse dinheiro público.

Do UOL