Emocionado, paciente da Prevent diz na CPI que médicos queriam deixá-lo morrer

O advogado Tadeu Frederico de Andrade, atendido pela Prevent Senior quando teve Covid, disse à CPI da Covid nesta quinta-feira (7) que médicos da operadora de plano de saúde usaram o prontuário de outra paciente para tentar convencer a família dele a tirá-lo da UTI e enviá-lo aos cuidados paliativos.

Na época, Tadeu estava intubado. Segundo o relato dele, os médicos da Prevent alegavam que ele não tinha mais cura. Ele relatou que uma médica da Prevent disse a suas filhas que, nos cuidados paliativos, “teria maior dignidade e conforto, e meu óbito ocorreria em poucos dias”. Os equipamentos da UTI que o mantinham vivo seriam desligados.

A Prevent Senior virou alvo da CPI depois de denúncias de pacientes e ex-médicos do plano de saúde. Segundo os relatos que chegaram aos senadores, a direção da Prevent obrigou a equipe a receitar o chamado “kit Covid” para pacientes com a doença. O kit, defendido pelo presidente Jair Bolsonaro e aliados, é composto por remédios que a ciência já sabe que não têm eficácia contra a doença.

A Prevent também é suspeita de ter omitido mortes em um estudo com pacientes que tentava validar o uso do kit.

A Prevent vem negando essas acusações e denúncias. A operadora diz ainda que sempre atuou dentro dos parâmetros éticos e legais.

No depoimento à CPI, Tadeu contou que, primeiro, a médica da Prevent tentou obter de uma filha sua o consentimento para desligar os aparelhos que o mantinham vivo. A filha recusou. Em seguida, segundo o relato, as duas filhas de Tadeu foram chamadas para uma reunião com três médicos da Prevent.

Foi nessa ocasião em que, segundo ele, os médicos apresentaram, como se fosse de Tadeu, um prontuário de outra pessoa, que apresentava comorbidades que o advogado nunca teve.

“Nessa reunião, eles tentam convencer minha família de que, pelo prontuário na mão, eu tinha marcapasso, eu tinha sérias comorbidades arteriais e que eu tinha uma idade muito avançada. Esse prontuário não era meu, era de uma senhora de 75 anos. Eu não tenho marcapasso. A única coisa que tenho é pressão alta. Sempre tive”, relatou Andrade.

Ele contou ainda que, no prontuário dele, a médica incluiu que a família tinha permitido a ida para os cuidados paliativos, o que, segundo Andrade, é uma “mentira”.

“Ao final, diz no prontuário que está em mãos da CPI e do Ministério Público de São Paulo, ela [a médica] escreve: ‘em contato com a filha Maíra, a mesma entende e concorda [com os cuidados paliativos]’. Isso é mentira. Minha família não concordou”, continuou Andrade.

Em nota, a Prevent ressaltou que não iniciou o tratamento paliativo em Andrade sem a autorização da família. E disse que a médica fez uma sugestão à família, não uma determinação.

“O prontuário do paciente é taxativo: uma médica sugeriu, dada a piora do paciente, a adoção de cuidados paliativos. Conversou com uma de suas filhas por volta de meio-dia do dia 30 de janeiro. No entanto, ele não foi iniciado, por discordância da família, diferentemente do que o sr. Tadeu afirmou à CPI. Frise-se: a médica fez uma sugestão, não determinação”, disse a empresa (veja a íntegra da nota da Prevent ao final desta reportagem).

Voz embargada

O advogado prosseguiu no relato à CPI. Ele disse que a família ameaçou entrar na Justiça e recorrer à imprensa para que a Prevent o mantivesse na UTI. Neste momento, ele se emocionou e ficou com a voz embargada. Afirmou que, se não fosse essa atitude da família, ele não estaria vivo.

“Minha família não concordou nessa reunião com o início dos cuidados paliativos. Se insurge, ameaça ir à Justiça para buscar uma liminar para impedir que eu saísse da UTI e ameaça procurar a mídia. Nesse momento, a Prevent recua e cancela o início do cuidado paliativo. Ou seja, em poucos dias, eu estaria vindo a óbito. E hoje estou aqui”, completou Andrade.

O que ocorreria nos cuidados paliativos

O advogado também descreveu o que, segundo seu relato, a médica explicou para sua filha sobre o que correria com ele nos cuidados paliativos. A orientação da Prevent era para a equipe não tentar reanimá-lo caso ele tivesse uma parada cardíaca.

“Seria ministrada em mim uma bomba de morfina, e todos os meus equipamentos de sobrevivência na UTI seriam desligados. Inclusive, se eu tivesse uma parada cardíaca, teria uma recomendação para não haver uma reanimação”, contou Andrade.

Kit entregue por motoboy

Andrade disse que, ao sentir os primeiros os sintomas da Covid, no fim de dezembro, ligou para o serviço de telemedicina da Prevent Senior. Segundo Andrade, a consulta durou cerca de 10 minutos. Ele relatou que estava com febre e dor no corpo. A médica que lhe atendeu disse que mandaria medicamentos para a casa dele.

De acordo com Andrade, um motoboy foi lhe levar o “kit Covid”.

“Foi enviado por motoboy. Comecei a tomar. Não tinha o que contestar. Estava sendo orientado por uma médica”, disse o advogado à CPI.

Andrade disse que, cinco dias depois de começar a tomar os remédios do kit, sua saúde piorou. Foi quando ele decidiu ir a um pronto-socorro da Prevent. Lá, foi diagnosticado que a Covid tinha lhe causado uma pneumonia bacteriana, que estava avançada. Ele foi intubado em seguida.

Íntegra

Veja a nota divulgada pela Prevent sobre o tratamento do paciente Tadeu Andrade:

A Prevent Senior refuta ter iniciado tratamento paliativo ao paciente Tadeu Frederico de Andrade sem autorização da família. Já tornado público via imprensa, o prontuário do paciente é taxativo: uma médica sugeriu, dada a piora do paciente, a adoção de cuidados paliativos. Conversou com uma de suas filhas por volta de meio-dia do dia 30 de janeiro. No entanto, ele não foi iniciado, por discordância da família, diferentemente do que o sr. Tadeu afirmou à CPI. Frise-se: a médica fez uma sugestão, não determinação. O paciente recebeu e continua recebendo todo o suporte necessário para superar a doença e sequelas.

Do G1.