“Deus me proteja da Defensoria”, analisa jornalista sobre ação contra o fim do racionamento

O jornalista Felipe Gesteira publicou um texto na edição desta terça-feira (22) do jornal A União analisando a decisão da justiça em suspender o fim do racionamento de água em Campina Grande e o papel da Defensoria Pública do Estado em ir contra os benefícios para a população.

Confira abaixo o texto.

Deus me proteja da Defensoria
Por Felipe Gesteira*

Parece que a cultura do “quanto pior, melhor” voltou a assombrar a política paraibana. Após décadas de espera pela transposição do rio São Francisco, a população de Campina Grande e região está prestes a se ver livre do racionamento de água. O açude Boqueirão finalmente ultrapassou seu volume morto. Com base em estudos técnicos, o Governo da Paraíba anunciou, ontem, antecipar para esta sexta-feira o fim do racionamento para mais de 700 mil pessoas da Rainha da Borborema e cidades da região.

A Justiça, no entanto, não quis saber, e atendeu um pedido da Defensoria Pública da Paraíba pela manutenção do racionamento.

Vejam só, logo a Defensoria. Um contrassenso no mínimo curioso.

Já vi disputas entre governos, entre poderes. Mas com um órgão de defesa agindo assim, é a primeira vez.

A briga pelo apoio político na terra dos coronéis sempre prejudicava a população. Eram cortes de verbas, cidades inteiras esquecidas porque seu prefeito não era aliado do governador, ou porque eram pequenas demais, não representavam um coeficiente político substancial. Fechava-se a torneira dos recursos para isolar a gestão municipal. A população ficava como um prisioneiro nos porões de um Estado de exceção. À míngua, até que seu representante se curvasse ao líder mais ‘poderoso’. Era o fazer dos reis da Idade Média aplicado por coronéis dotados de herança e sobrenome.

Há muito tempo não se vê esse tipo de prática vil por aqui. Prova maior disso são as obras e ações em diversos municípios. O Pacto pela Aprendizagem na Paraíba teve adesão de 219 dos 223 municípios, óbvio que nem todos com prefeitos aliados do governador.

A política pública voltada ao cidadão, a contra-hegemonia em levar uma ação do Estado a quem precisa, independente de beneficiar um aliado ou um adversário político, isso mexe com a instituição que é o coronelismo, povoado por abutres que dependem exclusivamente do sofrimento. A chegada da água vem para destronar aqueles que se fortalecem no atraso.

Se a Transposição era promessa de campanha de diversos políticos desde a década de 1980, a realização da obra acaba de uma vez por todas com os cabrestos. Água é vida, é dignidade. E principalmente autonomia. O mau político se acovarda diante de um povo autônomo. Por isso há, ainda, quem se regozije com o retrocesso.

Desde quando o governo anunciou o fim do racionamento em Campina Grande, as vozes decadentes da política velha cantam sua própria ruína. O povo não é bobo. Se querem tirar a água dos mais necessitados, que arquem com as consequências. Atrairão para si o ódio daqueles que enfrentam o racionamento e agora, ante o fim do sofrimento, se veem em meio a um fogo cruzado no tiroteio político. Não vai ter concessão de veículo de comunicação que salve essa laia da opinião pública.

E onde fica no meio disso tudo a Defensoria, patrimônio do povo paraibano, sem qualquer ligação política?

Imaginem uma instituição humanitária, em pleno cenário de guerra, lutando com todas as suas forças e junto à Justiça local para que as vítimas do conflito armado não tenham acesso a remédios e atendimento médico sob a justificativa de que os donativos podem acabar, mesmo que um estudo técnico prove o contrário. Vidas seriam prejudicadas? Sim.

Sinto pelo povo de Campina Grande, cidade que amo tanto, como se fosse minha.

Deus os livre.
Deus nos guarde.

Deus me proteja da maldade de gente boa
da bondade de pessoa ruim
e desta Defensoria, assim.