O empresário Eduardo Ribeiro Victor, proprietário da Compecc e o engenheiro da construtora, Glauco Rogério Cavalcanti de Oliveira, prestaram depoimentos ao Ministério Público Federal (MPF) para esclarecer irregularidades apontadas no relatório da Controladoria Geral da União (CGU) sobre a obra de infraestrutura do Parque Solon de Lucena – Lagoa. De acordo com o procurador da República Yordan Delgado, que é responsável pelo inquérito, falta ouvir o secretário de Infraestrutura da Prefeitura de João Pessoa Cássio Andrade e o engenheiro responsável pela obra.
O Paraíba Já teve acesso, com exclusividade, aos depoimentos dos envolvidos e mostra que há incompatibilidade de informações das empreiteiras e das que são informadas nos boletins de medição da obra, que são uma espécie de nota fiscal. Há ainda informações que confrontam o relatório da CGU.
Eles confirmam que foram retiradas, aproximadamente, mais de 200 mil toneladas de resíduos do local, que o dique para recebimento destes resíduos, construído no aterro sanitário, foi feito em proporções menores do que estava indicado na contratação e que 45 caminhões da frota da empresa, mais 13 terceirizados, fizeram o transporte do material para o aterro.
No boletim de medição nº 8, datado de 26 de dezembro de 2014, foi especificado que caminhões do tipo basculante, com capacidade de seis metros cúbicos, fariam o transporte do material. Já no depoimento ao MPF, Glauco afirmou que 45 caminhões tinham capacidade para 16 metros cúbicos e os 13 terceirizados, comportavam 12 metros cúbicos. Mas, que nas anotações feitas pelos funcionários do aterro sanitário, todos os 58 veículos foram registrados com capacidade de 12 metros cúbicos.
Para a CGU, tanto a empresa quanto a Prefeitura de João Pessoa, informaram que para a retirada das 200 mil toneladas de resíduos, foram utilizados mais de 100 veículos e não 58, como foi informado no depoimento ao MPF.
Ainda sobre a retirada do “lixo”, Glauco explicou que durante o dia, escavadeiras eram usadas para retirar solo mole do interior da Lagoa e que o material extraído era colocado às margens e somente três dias depois eram removidas para o aterro.
Para a CGU, foi declarado que o transporte dos resíduos era feito à noite, todos os dias da semana. Já ao MPF, eles declaram que o serviço era realizado apenas em dias úteis.
Boletim de medição
A reportagem do Paraíba Já buscou informações no Sistema de Convênios (Siconv), pois a obra de infraestrutura e revitalização do Parque Solon de Lucena recebeu recursos através de convênio com o Ministério das Cidades. Lá, conseguimos ter acesso ao 8º Boletim de Medição, único apresentado até agora, que é um documento em que detalha o que está sendo executado e gasto na obra.
De acordo com este documento, a Prefeitura de João Pessoa declara que foram gastos com a etapa de desassoreamento aproximadamente R$ 7,7 milhões. Destes, R$ 6,9 milhões, equivalente a 89,61% dos recursos para esta etapa, foram destinados para a remoção do ‘lixo’ e o transporte até o aterro sanitário, local em que o secretário Cássio Andrade afirmou que foram descarregadas as milhares de toneladas de resíduos.
A empresa responsável pela obra é a Compecc Engenharia e o valor contratual apresentado neste boletim de medição é de R$ 19,9 milhões, para desassoreamento, drenagem, construção de muro de contenção e galerias. Para se ter uma ideia, o maior custo apresentado nessa obra neste documento é com o desassoreamento, representando 38,69% dos recursos.
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De acordo com o vereador Renato Martins (PSB), é impossível que se tenha retirado 200 mil toneladas de ‘lixo’, resíduos, de dentro da Lagoa e ter transportado até o aterro sanitário em apenas oito meses de obras, e, como a PMJP informa, o serviço foi feito à noite. Ele afirma que seriam necessários 100 caminhões para o transporte de 200 mil toneladas de lixo no regime de 24 horas por dia durante quatro meses.
Frota insuficiente
Entramos em contato com a empresa responsável pela obra e, de acordo com o gerente de locação de veículos, Márcio Leite, a empresa possui apenas seis caminhões do tipo basculante, que foi o usado e discriminado no boletim de medição da PMJP, em sua frota na cidade de João Pessoa.
Ouça:
Inquérito na Polícia Federal
O procurador da República na Paraíba, Yordan Delgado, revelou que os próximos a serem convocados para depor serão o secretário de Infraestrutura da Capital, Cássio Andrade, e o engenheiro responsável pela fiscalização da obra.
A Compecc é a empresa responsável pela parte de infraestrutura da obra, que compreende a drenagem, dragagem e a reparação de um túnel.
Com a análise do relatório da CGU, o procurador Yordan Delgado decidiu agregar a Polícia Federal na investigação, pois, de acordo com ele, dois crimes podem ter sido cometidos pela Prefeitura de João Pessoa: improbidade administrativa e peculato – desvio de recursos públicos.
“Achei necessário acionar a Polícia Federal porque, pelo relatório da CGU, há indícios da prática de crime e algumas medidas investigativas podem ser tomadas dentro do inquérito policial, porque a polícia tem um corpo técnico maior que o MPF. Então, nós estamos lidando com a parte de improbidade administrativa e a Polícia Federal vai lidar com a parte de peculato”, explicou.
O procurador não descartou a possibilidade de o MPF e Polícia Federal atuarem juntas na investigação. “São investigações diferentes em termos, porque uma vai apurar a parte criminal e a outra improbidade. Mas, o mesmo fato que caracteriza o crime é o mesmo fato que vai caracterizar improbidade, que é a questão dos desvios públicos. Como nós estamos numa fase inicial, ainda não está havendo um trabalho em conjunto, mas há uma grande tendência que MPF e PF possam trabalhar nesse caso conjuntamente”, revelou.