Deltan é condenado a indenizar Lula por caso do PowerPoint

A Quarta Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu nesta terça-feira (22) por 4 votos a 1 que o ex-procurador da República Deltan Dallagnol deve pagar indenização de R$ 75 mil por danos morais ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por “ataques à honra” na entrevista na qual divulgou a denúncia do tríplex em Guarujá (SP).

Essa entrevista ficou conhecida pela apresentação de PowerPoint reproduzida em um painel. Foram quatro votos a um a favor da condenação do ex-procurador. Cabe recurso.

Para os ministros, Deltan usou expressões que não constavam na denúncia e tinham como objetivo ferir a imagem do ex-presidente. À época, Deltan afirmou que Lula era “o grande general” do esquema da Petrobras e que comandou uma “propinocracia”.

Na ação que chegou ao STJ, a defesa de Lula afirmava que a entrevista coletiva de Deltan “se transformou em um deprimente espetáculo de ataque à honra à imagem e à reputação” do ex-presidente.

Eles pediram R$ 1 milhão em danos morais pela realização da entrevista de setembro de 2016 na qual ele explicou a denúncia da Operação Lava Jato contra Lula pelo caso do tríplex em Guarujá (SP), que mais tarde levou o ex-presidente a ser condenado e preso.

Os magistrados, após discussão, fixaram essa indenização em R$ 75 mil. Corrigido desde o mês em que a entrevista concedida, o valor final será superior a R$ 100 mil.

O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, votou contra Deltan e disse que o então procurador usou na coletiva “expressões e qualificações desabonadoras da honra, da imagem” e, no seu entendimento, “não técnicas como aquelas apresentadas na denúncia”.

Segundo ele, no PowerPoint, Deltan usou termos que “afastavam-se da nomenclatura típica do direito penal e do direito processual penal”.

“A precisão, certeza, densidade e coerência que se exige da denúncia impõe-se igualmente ao ato de divulgar a denúncia”, afirmou Salomão. De acordo com o ministro, houve espetacularização na divulgação da denúncia, que não condiz com a apresentação da peça formal de acusação.

Os ministros Marco Buzzi, Antônio Carlos Ferreira e Raul Araújo seguiram o voto de Salomão. Já a ministra Isabel Gallotti discordou.

Para ela, a ação devia ser extinta sem a análise do caso. Sem julgar se os termos usados na entrevista foram corretos ou não, ela entendeu que Deltan Dallagnol seguiu uma recomendação feita à época a membros do Ministério Público: a de que se convocasse entrevista coletiva para prestar conta dos atos.

A ministra entendeu que, nesse caso, a defesa de Lula deveria questionar a conduta do então procurador em uma ação contra a União.

Na ocasião da entrevista, em 2016, Deltan projetou um fluxograma que direcionava com setas 14 tópicos como “petrolão + propinocracia”, “mensalão” e “reação de Lula”, envoltos em círculos, ao nome de Lula, também em um círculo, no centro da imagem.

À época, procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato acusaram o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de ter comandado uma “propinocracia”, ou “um governo regido pelas propinas”.

Eles disseram que o governo do PT distribuiu cargos entre aliados e apadrinhados políticos com o objetivo de “arrecadar propinas” para alcançar a governabilidade, perpetuar o partido no poder e permitir o enriquecimento ilícito de agentes públicos e políticos.

Mais tarde, em seu livro “A Luta contra a Corrupção”, Deltan disse que a “repercussão negativa e imediata” para o gráfico para Lula, criticado nas redes sociais, o pegou de surpresa. No ano passado, durante entrevista a um podcast, o ex-procurador reconheceu que a apresentação foi um “erro de cálculo”.

De acordo com o advogado Cristiano Zanin Martins, que defende Lula, o então procurador da República cometeu abuso de autoridade.

“Referida apresentação foi marcada por adjetivações negativas totalmente incompatíveis com a garantia constitucional da presunção da inocência, com a dignidade da pessoa humana e com o devido processo legal, com o claro objetivo de estigmatizar o autor”, diz a defesa em seu pedido à Justiça.

Segundo Zanin, a intenção da coletiva foi desconstruir a “imagem positiva perante a população como decorrência de mais de 40 anos de atuação na vida pública de forma honesta e com enorme dedicação”.

Deltan Dallagnol, diz Zanin, “fez até mesmo uso de um PowerPoint com diversas flechas apontando para o nome do autor, colocando no centro do documento, transmitido ao público em geral, sobretudo ao leigo, a falsa impressão de que este último teria sido condenado pela Justiça pela prática dos crimes que estavam sendo imputados naquele momento”.

Antes do julgamento desta terça, o advogado questionou aos ministros se seria legítimo o procurador ter convocado essa coletiva para “emitir juízo de culpa” contra o acusado.

Já o advogado de Deltan Dallagnol, Marcio Andrade, afirmou que não houve violação à honra ou dano moral que incida em indenização de dano moral e que a entrevista foi concedida dentro do exercício regular de procurador da República.

Também foi sustentado que essa entrevista foi concedida como as outras que foram feitas no âmbito da Lava Jato para informar à população a respeito dos andamentos da operação.

Em 2021, o Supremo anulou as condenações sofridas pelo ex-presidente em Curitiba. Também declarou que o ex-juiz Sergio Moro agiu de modo parcial ao conduzir casos do petista e invalidou provas colhidas na investigação.

Com isso, Lula recuperou seus direitos políticos e lançou sua pré-candidatura à Presidência em 2022. Ele tem liderado as pesquisas de intenção de voto, à frente do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Deltan, por sua vez, pediu exoneração do Ministério Público e filiou-se ao Podemos. O plano da legenda é lançá-lo como candidato a deputado federal pelo Paraná.

Do Folha de São Paulo.