Covid: Youtube derruba 4 vídeos em que Bolsonaro fala de remédios sem eficácia

O YouTube removeu mais quatro vídeos do canal do presidente Jair Bolsonaro “por violação das políticas de desinformação médica sobre a Covid” nesta sexta-feira (23). Neles, ele recomenda remédios que não têm comprovação médica para a doença.

Na última segunda (23), um vídeo de Bolsonaro já tinha sido tirado do ar pela plataforma por esse motivo. Assim, seriam 5 violações em menos de uma semana, o que, segundo a política de uso da plataforma, poderia resultar em suspensão.

Mas o YouTube diz que não tomou a medida porque existe um “período de carência”, uma vez que as regras sobre conteúdo com desinformação sobre a Covid na plataforma foram atualizadas recentemente.

Todos os vídeos tirados do ar são das lives que o presidente faz às quintas-feiras. Nesta sexta, foram derrubados os vídeos de 9 de julho de 2020, 26 de novembro de 2020, 10 de dezembro e 11 de fevereiro de 2021. Na segunda, sai do ar o de 14 de janeiro de 2021.

Atualização na política

Há uma semana, o YouTube atualizou sua política de uso, acrescentando a seguinte regra: vídeos que recomendem o uso de hidroxicloroquina ou ivermectina para o tratamento ou prevenção da Covid-19 – o que não é comprovado por médicos – seriam tirados do ar, inclusive de forma retroativa.

No dia em que a norma foi anunciada, o G1 questionou o YouTube sobre um dos vídeos das lives de Bolsonaro, de 14 de janeiro, em que ele fala que “tratamento precoce da Covid” não faz mal.

Somente após o questionamento, o vídeo foi tirado no ar. Mas, G1 encontrou outros exemplos em que o presidente defende os medicamentos sem eficácia comprovada para combater ou prevenir a Covid e que seguiam disponíveis até a última quinta (22). E voltou a consultar o YouTube.

A empresa informou nesta sexta que dois deles foram derrubados: os de 9 de julho e 10 de dezembro.

Mas outro vídeo apontado, de 15 de abril de 2021, permanece no ar e tem quase meio milhão de visualizações. Nele, Bolsonaro diz que tomou cloroquina. “Eu tomei e me safei, muita gente tomou e se safou. E isso chama-se tratamento precoce ou tratamento imediato, ou tratamento ‘off-label’, o médico tem o direito de bem receitar o que ele achar que é o melhor para o paciente.”

No entanto, o YouTube diz que o vídeo “não atingiu os critérios para remoção, por isso poderá permanecer na plataforma”.

Além disso, a empresa afirmou que os temas tratamento precoce ou medicamentos hidroxicloroquina e ivermectina apenas são considerados violações de acordo com o contexto em que são mencionados.

‘Carência’ antes de suspensão

Pela política do YouTube, na primeira vez que um canal viola as políticas de uso, o criador recebe apenas um alerta, “informando que ele precisa conhecer melhor as regras”. Se desrespeitar as regras uma segunda vez, vem o primeiro Aviso (também chamado de “strike”, em inglês).

Se você receber três avisos em 90 dias, seu canal será removido permanentemente do YouTube. Vale lembrar que cada aviso leva 90 dias, a partir da data de emissão, para expirar”, diz a plataforma.

No entanto, a empresa informou ao G1 que, no caso de violação que envolva uma regra que foi atualizada recentemente, existe um “período de carência” para que os criadores de conteúdo possam se adaptar. O prazo é de 1 mês a partir da implementação da política.

Isso significa que vídeos postados antes da mudança ou até um mês depois da atualização são removidos, mas não geram um aviso (“strike”) como penalidade. Assim, as 5 violações não resultaram na suspensão do canal de Bolsonaro.

Depois desse “período de carência”, os criadores que postarem novos vídeos em desacordo com a diretriz passam a receber sanções e, por isso, deverão redobrar a atenção, completa o YouTube.

As informações sobre a existência dessa “carência” foram publicadas na última quinta, no blog da empresa, apenas em português.

O que diz a política do YouTube

A plataforma informou no último dia 16 que passaria a retirar vídeos que tenham:

  • conteúdo que recomenda o uso de ivermectina ou hidroxicloroquina para o tratamento da Covid-19;
  • conteúdo que recomenda o uso de ivermectina ou hidroxicloroquina para prevenção da Covid-19;
  • afirmações de que ivermectina ou hidroxicloroquina são tratamentos eficazes contra a Covid-19;
  • alegações de que há um método de prevenção garantido contra a Covid-19;
  • afirmações de que determinados remédios ou vacinas são uma cura garantida para a Covid-19.

Além disso, em suas diretrizes, o YouTube diz que “também não é permitido o envio de conteúdo que dissemine informações médicas incorretas que contrariem as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS)”.

De acordo com a empresa, a conduta mencionada vale para:

  • tratamento;
  • prevenção;
  • diagnóstico;
  • transmissão;
  • diretrizes sobre distanciamento social e autoisolamento;
  • e a existência da Covid-19.

O que Bolsonaro fala nas lives?

Nos 5 vídeos tirados do ar desde segunda, Bolsonaro fala de remédios como se fossem recomendados para tratamento ou prevenção da Covid – ainda que não tenham eficácia comprovada.

Vídeo de 9 de julho de 2020

No vídeo feito a partir de transmissão ao vivo, o presidente recomenda por mais de uma vez o uso de hidroxicloroquina e da ivermectina contra a Covid-19. Ele chega a mostrar uma caixa com hidroxicloroquina. O vídeo contava com mais de 360 mil visualizações. Veja os trechos:

“… declarou que tomou por ocasião de seu tratamento, a hidroxicloroquina, e eu tomei, e deu certo. Eu tô muito bem, graças a Deus. E aqueles que criticam, pelo menos apresentem uma alternativa. Ora, não dá certo a hidroxicloroquina, você tem que tomar a ivermectina ou então a anitta, que é outra também que está muito comentada por aí, e que são eficazes no tratamento do coronavírus.”

“Nós temos relatos de centenas de médicos no Brasil e de centenas e centenas de pessoas, que foram infectados, e foram tratados com isso [hidroxicloroquina e ivermectina] e deu certo”.

Vídeo de 26 de novembro de 2020

Nessa live, Bolsonaro diz: “A questão do Covid, África Subsaariana, abaixo ali do deserto do Saara, muito comum malária. A pessoa quando era atendida com malária e Covid tomava hidroxicloroquina, e ficava bem. Conclusão, se A é amigo de B, e B amigo de C, logo A é amigo de C. Não é isso? Matemática. Então, a conclusão foi essa. Zombaram de mim, chamaram de capitão hidroxicloroquina. Agora, não apresentavam alternativa.”

Vídeo de 10 de dezembro de 2020

Em vídeo do final do ano passado, com mais de 168 mil visualizações, Bolsonaro diz: “O que que tem no hospital? O respirador. Salva gente? Salva gente, sim, salva gente, mas tem que se evitar aí o intubamento da pessoa. Evita-se como? Numa primeira fase, o tratamento, que é a tal da hidroxicloroquina, ivermectina e anitta, entre outras coisas, vitamina D, azitromicina. Hoje os médicos sabem disso, se o teu médico fala que não, você tem o direito de procurar outro médico.”

Vídeo de 14 de janeiro de 2021

O vídeo que foi retirado do ar após questionamento do G1 continha afirmações similares às da live de 9 de julho de 2020. Na publicação, que tinha mais de 270 mil visualizações, o presidente recomendava o uso de hidroxicloroquina e ivermectina contra a Covid-19 ao lado do então Ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Veja o trecho:

Se fosse esperar uma comprovação científica, teriam morrido quantas pessoas naquela Guerra do Pacífico, que não morreram. É a mesma coisa o tratamento precoce da Covid com hidroxicloroquina, com ivermectina, uma tal da anitta, mais azitromicina, mais vitamina D. E não faz mal isso aí. Se, lá na frente, for comprovado que não surtia efeito, que não vai acontecer porque, repito, nesse prédio que eu tô aqui, mais de 200 pessoas contraíram Covid, e foram tratadas precocemente, nenhuma foi para o hospital.

Vídeo de 11 de fevereiro de 2021

“E tá uma polêmica muito grande, o consumo sobre hidroxicloroquina, fabricou a mais, gastou, era dinheiro do Covid, não era. Pessoal, tem a Covid aí, outras doenças continuam, não é só a Covid, a Malária continua, o Lúpus continua. Nós temos aqui em média 200 mil casos de malária, e eu não sei quantos comprimidos a pessoa toma para se curar de malária, mas muita gente na região amazônica toma preventiva”, disse Bolsonaro.

“Ninguém está fazendo nada errado ou jogando fora. Agora, existe o tratamento ‘off-label’, tem gente que não quer entender isso aí. Tem muito médico que usa a hidroxicloroquina, ivermectina, etc, para o tratamento precoce, então houve um consumo maior sim disso. Eu tomei, qual o problema?“, afirmou.

Em outra fala, Bolsonaro confirma que não há comprovação de eficácia sobre o uso do medicamento. “Agora tem uma nova notícia, não está comprovada ainda, tá? Tudo não tá comprovado. O uso da hidroxicloroquina em nebulização. Então, informações que chegaram aqui, falta uma comprovação maior da nossa parte, mas os relatos são que em poucas horas uma pessoa que receba nebulização da cloroquina se sentiria aliviado a partiria para a cura. Logicamente, apenas uma pessoa, a informação, mas logicamente tem gente que realmente está preocupado com isso. Médico que tem coragem.”

Do G1.