Colunista fala sobre fim do Jornal da PB e discute os novos rumos do jornalismo

Por Sandro Alves de França

No dia 07 de abril, dia do jornalista, toda a classe aqui da Paraíba recebeu um legítimo presente de grego: o anúncio do fechamento do Jornal da Paraíba, um dos três jornais impressos do Estado, com 45 anos de circulação e o segundo mais vendido. Falam-se em mais de 120 demissões, dentre jornalistas, diagramadores, designers e demais profissionais.  Anunciada numa data simbólica, a decisão soou como uma ironia ferina, corrosiva, impiedosa até.

O Jornal da Paraíba há muito tempo não se pagava. Pelo contrário, gerava prejuízo mensal na ordem de R$ 200 mil, é o que relatam algumas pessoas que trabalham na rede Paraíba de Comunicação, grupo proprietário da marca. Era mantido pelo status e simbolismo que um veículo impresso ainda tem.

Eduardo Carlos, o dono da Rede Paraíba, disse que manter o jornal se tornou insustentável, repetiu o discurso onipresente da crise – a atual econômica, porque a do jornalismo tradicional é permanente. Fez uma despedida melancólica, excessivamente enxuta e sem apresentar perspectiva para o vácuo que o fechamento do Jornal deixa.

A coisa, no entanto, vai muito além dessas justificativas comerciais, vai para a natureza, o cerne da função e do conceito que é um jornal diário e impresso. Em seu livro “A Arte de Fazer um Jornal Diário”, o tarimbado jornalista Ricardo Noblat fala sobre os pilares da manutenção de um jornal impresso. Publicado em 2002, o livro já atentava que os veículos de mídia impressa não deveriam se debruçar sobre o meramente informativo, porque isso a rádio, a TV e a Internet já faziam e com muito mais eficácia, em tempo real.

O modelo de produção de um jornal diário e impresso enseja, nessa perspectiva, um recorte analítico-interpretativo da realidade, uma vez que o fato noticioso já é de amplo conhecimento do público, sobretudo com o advento dos smarphones e da Internet 3G e 4G, que colocaram a notícia literalmente à palma mão, 24 horas por dia, 7 dias por semana. Simplesmente não faz mais sentido publicar matérias  com 10, 12, às  vezes mais de 20 horas depois de ocorrido um acontecimento apenas num viés informativo.

Não é isso, infelizmente, que se vê hoje nos jornais paraibanos. Para além disso, na Paraíba, os jornais impressos não conseguiram, em grande medida, criar um elo entre a comunidade de leitores e sua marca editorial. Ao final, se transformaram não em canais de mediação conteudística e informacional, de interligação com a população, mas meros reprodutores de um conteúdo que, dado o seu consumo, não possui quase nenhuma ressonância social.

O modelo de jornalismo industrial também já demonstra claros sinais de esgotamento. Essa lógica de redação padrão fordista-taylorista, hipersetorizada e com estruturas enormes se tornou anacrônica e inviável, dispendiosa demais. Hoje se faz notícia com tablete na rua e se envia direto para a plataforma, tem aplicativos de conteúdo jornalístico que se retroalimentam, o repórter que, com câmera do seu smartphone faz streaming (cobertura em vídeo ao vivo) e dispensa cinegrafista e fotógrafo.

No futuro, talvez apenas os grandes grupos multimídia consigam manter algo parecido, e mesmo assim com ajustes e enxugamento. Ainda se está descobrindo qual o papel que o jornalismo deve assumir na sociedade da informação e das convergências digitais.

Outro aspecto delicado é a situação a que são submetidos a grande maioria dos jornalistas que atuam no mercado. A dinâmica da coisificação e efemeridade virou a tônica maior. Esses profissionais, não importa o gabarito e a competência, são como material facilmente descartável, apenas mais uma peça na engrenagem. Temos redações desumanizadas, mecânicas, sempre ávidas por produção, produção, produção – e quase nenhuma fruição. Isso me faz lembrar a cena clássica e icônica de Charlie Chaplin em Tempos Modernos, onde o operário é mecanizado ao ponto de surtar de vez. Quem já vivenciou a rotina estafante de trabalho, cobrança e estress na quase totalidade dos veículos sabe bem do que falo.

Hoje, as prerrogativas do jornalismo se ampliaram vertiginosamente: o volume de trabalhou aumentou ao menos três vezes mais e o salário estagnou ou até mesmo diminuiu. Uma coisa é certa: a sociedade, brasileira, paraibana, mundial, necessita de bons profissionais de comunicação – e gente confiável e competente. A comunicação é um uma das maiores demandas sociais do mundo moderno e um direito humano básico, reconhecido pelo ONU. O direito ao trabalho digno também. Aos jornalistas dispensados do Jornal da Paraíba, minha solidariedade. A luta continua enquanto houver vida pulsando – a matéria prima essencial do verdadeiro jornalismo.