Salve, Belchior! O homem que chutou o balde!

Belchior entrou na minha vida pois fez uma música (Como nossos pais) que teve na gravação de Elis Regina uma das mais belas canções feita em língua portuguesa de todos os tempos. Depois Engenheiros do Hawaii gravou Alucinação e Los Hermanos inseriu no repertório deles A Palo Seco. Eu passei a garimpar coisas dele. Comecei a ler vorazmente sobre a história de vida dele e logo vi que ali estava um completo doidão.

Abandonou a medicina pra tocar na feira e décadas depois abandonou a vida artística e ‘civilizada’ para morrer em cidade bucólica e no ostracismo sem fazer nada além de ler. Antes de jogar tudo pra cima, ele estava fazendo uma releitura da A Divina Comédia, de Dante Alighieri, para uma linguagem sertaneja. Ele também abandonou este projeto. Desistiu de tudo. E foi viver longe dos holofotes. Sua forma de desaparecer da civilização deixou débitos por todos os cantos. Noticiaram sua morte em Santa Cruz do Sul, mas perambulou por Porto Alegre, São Paulo, interior do Rio Grande do Sul e no Uruguai. Ele de alguma forma se identificava com a cultura dos pampas.

Sua obra musical é genial. Ele tinha um jeito peculiar de tocar. Cearense de Sobral, carregava o lirismo de Bob Dylan, uma poesia inteligente e uma pegada com forte sotaque nordestino de quem entende do ‘leriado’. Todos os seus discos lançados nos anos 70 são maravilhosos. É um artista que eu morrerei dizendo pra todo mundo ouvir. Merece todas as homenagens pelo que fez como músico e nós, fãs dele, que sonhávamos com uma volta triunfante como atração da noite de um Rock in Rio, vamos ter que nos contentar em celebrar sua memória.

O rapaz latino americano sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior. Merece ser estudado. E sua obra reverenciada sempre. Confesso que queria ter assistido a um show dele no auge de sua carreira, com uma big band produzida por ele. O máximo que cheguei a ver foi ele tocando com voz e violão em um show da Capital quando saia do cinema. O passado é uma roupa que não nos serve mais.

Pros mais curiosos como eu, indico verificar umas arengas que ele expunha dentro de canções que eram verdadeiras respostas a Raul Seixas e Caetano Veloso. Depois eu escrevo sobre isso porque o assunto rende.