Rotina difícil: Mães apenadas sofrem na hora da separação dos filhos

Foto: Marcos Russo/A União

No rosto, a expressão vazia de quem perdeu algo importante e, nos olhos, o aglomerado de lágrimas de quem enfrentou uma dura separação. “O momento da despedida foi o pior da minha vida, porque parecia que estavam arrancando um pedaço de mim”, conta Maria José Muniz, uma das 411 apenadas da Penitenciária de Recuperação Feminina Maria Júlia Maranhão. O que diferencia ela de algumas das outras, é que Muniz passou sua gestação na prisão e seu bebê, a pequena Nayá Elen, ficou com ela até completar sete meses de vida.

Segundo Mirtes Daniele da Silva, diretora da penitenciária, a lei estabelece que as mães apenadas têm o direito de permanecer com suas crianças durante o período de amamentação, ou seja, por até 6 meses. Uma vez passado esse tempo, a diretoria entra em contato com algum familiar para que assuma os cuidados do pequeno e, caso não haja um, o conselho tutelar é contatado a fim de procurar um local que possua as condições para receber a criança até que a mãe cumpra sua pena. No Maria Júlia Maranhão, cinco mães estão aguardando a separação e outras quatro mulheres estão gestantes. No estado, existem ainda outras três penitenciárias femininas, nos municípios de Campina Grande, Patos e Cajazeiras. Neles, apenas duas mulheres estão com os filhos e cinco estão grávidas.

De acordo com a lei, a penitenciária deve oferecer assistência durante o período de gestação, disponibilizando uma sela adaptada, alimenta- ção apropriada e transporte até o hospital para que sejam feitos os exames; e também após o parto, entregando berços, alimentos e produtos adequados para o bem-estar do recém-nascido. Contudo, nada disso prepara o coração de uma mãe para o momento em que ela terá de afastar-se de seu filho. Maria José Muniz, por exemplo, quase entrou em depressão depois de entregar Nayá para sua mãe. “Essa parte da minha vida foi pior do que quando fui presa, o momento em que me separaram dela. Passei os dias seguintes muito abatida”, relata.

Ana Paula Jaciara é mãe de Maria Yoná e teme o momento em que terá de dar adeus. “Falta menos de um mês para minha filha ir embora e eu estou com o coração na mão, porque só de imaginar ficar longe dela. Ela ir para casa e eu continuar aqui, mas agora sem ela. É muito difícil”, lamenta enquanto segura a filha com firmeza. Entretanto, a mãe acredita que a distância não irá comprometer o amor que existe entre elas, porque ela já entrou em contato com o marido para que ele traga a garota para as visitas quinzenais.

Para receber esses visitantes, Mirtes explica que há um espaço de convivência geral. Ela lamenta não haver um ambiente específico para que mães e filhos possam interagir de maneira diferenciada. Em alguns casos específicos, as visitas são acompanhadas pelo conselho tutelar ou pelo serviço social do próprio presídio. Ela acrescenta que, para as mães, especialmente aquelas que estão com as crian- ças ou em fase de gestação, a unidade oferece atividades específicas, como palestras ou eventos que envolvem o tema da maternidade.

Tanto Maria José, como Ana Paula possuem um desejo em comum: sair da penitenciária para que possam cuidar de suas crianças. Além disso, elas querem recuperar o tempo que perderam pelos erros cometidos antes da chegada do milagre que foi o nascimento de suas filhas. O sonho, também compartilhado, é de que as meninas possam ter as oportunidades que elas nunca tiveram. “Acho que toda mãe tem sonhos para os seus filhos. Quero que ela complete seus estudos e que tenha mais chances do que eu tive”, explica Ana Paula.

“Ela é tudo e não há distância que vá mudar o que sentimos uma pela outra”

Foto: Marcos Russo/A União

Quando Jeilma Fernandes chegou à Penitenciária de Recuperação Feminina Maria Júlia Maranhão, nunca lhe passou pela cabeça a possibilidade de estar grávida. Durante cinco meses, ela ficou junta de outras apenadas e somente quando os indícios de que poderia estar gestante começaram a se manifestar de maneira mais intensa e frenquente, é que ela realizou o exame. “Para mim foi um choque e ao mesmo tempo foi uma grande alegria, porque seria minha primeira filha. Foi realmente um presente de Deus, não em um lugar que eu queria estar, mas ainda foi”, relata sobre os sentimentos que lhe invadiram ao receber a notícia.

Ao descrever a gestação e também o parto de Rafaelly Vitória, Jeilma expressa através dos olhos e do sorriso um amor sincero e, de certa forma, inocente. “A chegada dela serviu para que eu revisse e valorizasse muitas coisas da minha vida. Minha filha se tornou tudo para mim e é uma experiência boa, não sei nem como explicar”, conta. Ela explica ainda que, quando a filha nasceu, ela mudou completamente de vida, adotando um melhor comportamento e pensamentos mais positivos. Jeilma aponta: o que a salvou foi o amor pela sua filha.

Contudo, durante 4 meses de convivência, uma aflição vinha preenchendo seu coração. Por não possuir nenhum familiar próximo, a mãe temia que a sua filha, o seu maior tesouro, fosse levada para um abrigo e, consequentemente, adotada. “Minha mãe faleceu há seis anos e eu nunca conheci o meu pai, então não havia com quem deixar ela. Isso me deixava muito assustada e angustiada”, relata. Mas Jeilma foi surpreendida pela segunda vez: familiares que ela não via há 24 anos apareceram para visitá-la e, ao contar sua história, eles aceitaram cuidar da menininha.

Para Jeilma, sair da penitenciária deixou de ser uma questão focada no ‘eu’ e passou a ser sobre ‘nós’. Presa há mais de um ano em provisória, ela espera receber a liberdade e poder ser feliz ao lado da filha. “Eu quero vivenciar todos os dias ao lado dela e tentar dar o melhor, com humildade, mas fazer o impossível pela minha filha”, fala com lágrimas nos olhos. A filha tornou-se sua força para lutar e enfrentar os dias de encarceramento. Como toda mãe, Jeilma deseja poder educar a filha para que ela trilhe um bom caminho e para que não passe pelas mesmas dificuldades pelas quais a mãe passou.

“Eu quero que ela cresça, estude e possa um dia dizer: eu tive uma mãe de verdade ao meu lado. E mais do que isso, eu quero ser mãe, amiga e companheira dela. Quero que ela se sinta e me veja dessa forma”, pontua sobre como ela espera que seja sua relação com a filha. Ela admite, por outro lado, que não se preocupa se seus familiares trarão ou não a menina para visitá-la enquanto ela cumprir pena. “Tudo que importa é que ela esteja bem, é saber que estão educando, alimentando e cuidando bem dela. Porque se eles fizeram isso, eles tão cuidando de mim também, eles estão me alimentando também. Para mim, ela é tudo e não há distância que vai mudar o que sentimos uma pela outra”, conclui.

As informações são do Jornal A União