Produção musical independente aumenta mercado fonográfico na PB

Não é segredo para ninguém que a cena musical independente da Paraíba está bem ativa. Grupos como Seu Pereira e Coletivo 401, Burro Morto, Macumbia, A Troça Harmônica, Gauche, Os Gonzagas e muitos outros movimentam o estado, principalmente durante os fins de semana do Centro Histórico da capital. Além disso, alguns deles gravaram ou estão gravando músicas, EPs e álbuns. Paralelamente, o surgimento de novos estúdios musicais na cidade está cada vez mais aparente.

Para entender o fenômeno, conversamos com alguns dos proprietários desses estabelecimentos. Embora a Paraíba conte com estúdios de gravação há algumas décadas – como o Pindorama, no Roger, e o estúdio de Sérgio Gallo, no Castelo Branco –, foi justamente nos últimos dez anos que uma nova leva de novos espaços surgiu. Um deles é o estúdio Mutuca, localizado nas proximidades da Praça Antenor Navarro, no Centro Histórico – que também abriga outros, como o Gata Preta e o Capim Santo (este último de ensaios).

O Mutuca surgiu em 2007, organizado por três integrantes da banda Burro Morto: Haley Guimarães, Daniel Jesi e Ruy José. Embora já tivessem parceiros em estúdios musicais, queriam ter mais liberdade criativa durante as gravações. “O tempo em estúdio é caro, então isso acabava atrapalhando na hora de compor. Quando estamos em um ambiente confortável sem preocupação com tempo, as coisas fluem melhor”, explica Daniel.

A princípio, era apenas um espaço para a Burro Morto criar livremente, mas, aos poucos, acabou se tornando um negócio. “A gente não consegue se sustentar apenas com a renda do Mutuca, mas é nosso trabalho, dedicamos uma boa parte do nosso tempo ao estúdio”, comenta o músico. No entanto, com o tempo, outros artistas acabaram se interessando em alugar o espaço e se utilizar dos serviços oferecidos pelo trio.

Pelo Mutuca, passaram artistas como Baluarte, Sandra Belê, Lucas Dourado, Cabruêra, Rieg e Gauche. O maior desafio, para Jesi, é fazer uma separação entre o profissional de estúdio e o profissional da música. “Ser músico ajuda bastante no diálogo com os outros artistas, mas é preciso fazer uma distinção entre trabalhar para si e trabalhar para os outros. Temos nosso estilo e modo de trabalhar e ele não pode sobrepor à proposta estética e sonora do nosso cliente. Obviamente, há trocas e diálogo, mas os músicos que vêm ao nosso estúdio precisam ter seu próprio espaço criativo”, enfatiza o baixista da banda Burro Morto.

Outro integrante de banda que decidiu ter um estúdio é Marcelo Piras, que, ao lado de Pepeu Guzman (engenheiro de som), comandam há três anos a Mardito Discos, na Almeida Barreto, Centro. A ideia de criar um espaço próprio veio depois da gravação do segundo EP da Dalva Suada, grupo o qual Marcelo fazia parte. “Foi uma experiência muito interessante, o que nos motivou inicialmente a pensar em criar um selo, mas percebemos que o mercado local ainda não era propício para isso. Por isso, começamos montando um espaço para que os artistas pudessem fazer bons registros”, explica Piras.

Ao falar de estúdios musicais, o Peixe-boi, nos Bancários, não pode deixar de ser citado. Em atividade desde 2002, já passaram por lá artistas de renome como Seu Pereira e Coletivo 401, Adeildo Vieira, Escurinho e Chico César, além de ter sido o local onde o grupo Jaguaribe Carne gravou o histórico CD “Vem no Vento”. O proprietário Marcelo Macedo acredita que o crescimento recente dos estúdios musicais encontra explicação em dois fatores.

“Os coletivos do Centro Histórico fomentam o surgimento de novas bandas e a necessidade de registrar aquilo, enquanto o curso de Música da UFPB vem estimulando bastante o interesse dos alunos pelos estúdios”, analisa. Recentemente, o Peixe-Boi fez a mixagem de um projeto de estudantes do curso da universidade, intitulado “Gravina”, projeto coordenado pelo músico Xisto Medeiros.

Na percepção deles, a expansão da cena musical independente no estado e o surgimento dos estúdios estão interligados. “A gente percebe que cada vez mais bandas procuram a gente para registrar seu trabalho. E mesmo que não tenham sido selecionados por algum edital público, alguns deles tiram dinheiro do próprio bolso ou juntam grana da venda de ingressos dos shows para fazer uma gravação”, observa Marcelo. Para Ruy José, do Mutuca, é uma característica da era da Internet. “Nos anos 1980 e 1990, muitas bandas passavam mais de uma década apenas fazendo shows e, com o sucesso, eventualmente assinavam contrato com alguma gravadora. Agora, parece que há uma cobrança, enquanto você não registrar seu trabalho em estúdio, você não entra efetivamente no rol de artistas”, opina.

“A gente sente que valeu a pena ter criado o estúdio quando vemos a alegria de uma banda ao ter seu trabalho registrado”, completa Marcelo Piras. Embora ainda não tenham alcançado o objetivo de se tornarem um selo musical, os donos da Mardito Discos se preparam para lançar uma coletânea com 10 artistas da Paraíba, intitulada “Malditos Marditos”, contando com nomes como Totonho, Evoé, banda-fôrra, Macumbia, dentre outros. “A ideia é que, no futuro, nós consigamos fazer um trabalho de agenciamento das bandas, cuidando não apenas do registro, mas também da pré e pós-produção delas, ajudando na criação e na divulgação do trabalho”, projeta Piras.

Com informações de André Luiz Maia