Maria Bethânia apresenta “Abraçar e agradecer” neste sábado no teatro Pedra do Reino

Não fica nem vai embora. Como um eterno devir, o fluxo permanente de energias que rege o Universo, a carreira de Maria Bethânia, uma lenda viva na nossa música, chega a seu cinquentenário. Para comemorá-lo em plena forma, nada mais natural que uma turnê, que ela utiliza para Abraçar e Agradecer aquele que sempre esteve ao seu lado: o público.

Mas há também espaço para o autorreconhecimento. “Graças a Deus, estou comemorando 50 anos de trabalho. Consegui chegar aqui com saúde, vigor e amor ao meu ofício, que é o mais importante, e com dedicação. É bonito ter conseguido me manter, eu agradeço a isso, à minha perseverança, à minha dedicação. Acho que Deus determinou que essa minha encarnação seria dedicada a essa missão. Ele não me deixou casar ou ter filhos, nada. Ele me mandou fazer isso e pronto, e eu faço com muito rigor e prazer”, declara Maria Bethânia.

No show que acontece no Teatro Pedra do Reino, ela traz um espetáculo visual, com telões de LED que cobrem o chão e iluminação elaborada, ao ponto de construir verdadeiros cenários apenas com o jogo de luzes. A concepção é de Bia Lessa e a luz assinada por Binho Schaefer. “Eles que construíram tudo isso e eu só vi o resultado no dia do ensaio geral. Até então, ela não tinha me mostrado nada. Fiquei muito comovida, como se fosse um presente para mim”, revela.

E por falar em presentes, o visual de Abraçar e Agradecer é apenas um dos muitos que ela está recebendo durante o ano de homenagens. Em julho, ela ganhou uma exposição com a participação de mais de uma centena de artistas plásticos, com obras inspiradas em sua vida e obra, intitulada Maria de Todos Nós, que ficou em cartaz até setembro no Paço Imperial, no Rio de Janeiro.

“Isso é muito forte, uma cantora popular penetrar, tocar com seu trabalho, artistas plásticos, transcender as barreiras entre as artes”, conta a intérprete. Em 2016, as homenagens continuam, já que Bethânia é homenageada pela Mangueira, com o enredo “Maria Bethânia, a menina dos olhos de Oyá”.

Voltando ao show de logo mais, o repertório, que conta com o expressivo número de 41 canções, traz obras de Dominguinhos, Caetano Veloso, Chico Buarque, Gonzaguinha, Raul Seixas e Paulo Coelho, Paulo César Pinheiro, Roberto Carlos, entre outros. A Paraíba também está bem representada, com dois autores: Chico César e Flávia Wenceslau.

A frase que abre este texto é extraída da música “Estado de poesia”, de Chico César, que Bethânia interpreta no DVD Carta de Amor, e que, segundo ela, é uma das canções mais bonitas já feitas no Brasil. “Chico César é meu caboclinho, meu grande amigo, que me ajuda muito na procura por repertório. Foi ele que me apresentou a canção de Flávia e compôs uma música especialmente para esse show dos 50 anos, chamada ‘Xavante’, uma cantiga sobre os índios, que eu acho uma obra-prima”, declara.

Índios, mares, tempestades, amores e serenidade. Temas recorrentes na carreira de Maria Bethânia, que carrega consigo o DNA brasileiro, o recorte do Brasil profundo – para a cantora, o Brasil “de verdade”, pois, “o resto é uma balela que tentam vender e empurrar goela abaixo”.

E ela dá o alerta. “Na minha goela não desce, não vem que não tem. Eu gosto do Brasil do jeito que ele é: menino, caipira, com um mar deslumbrante, com o céu raro, o Cruzeiro do Sul. Gosto do Brasil com sua realidade de dificuldades, mas com a seriedade e dignidade do povo brasileiro”, enfatiza.

Bethânia não desdenha da tecnologia – afinal, seu show atual é repleto de artifícios –, contudo tem suas ressalvas, por acreditar que as pessoas a utilizam como escapismo. “Acho que não se pode esquecer tudo e pensar só em tecnologia, é burrice. Deve ser usado de todas as maneiras, tudo o que for benéfico para a ciência, para as artes, o que puder ser extraído para o bem é maravilhoso. Não gosto de ver adolescente 24 horas mandando recadinho, fotinha, isso eu detesto. É uma perda de tempo gigantesca, eles deviam estar vendo o céu, lendo um livro, se distraindo, tomando um sorvete, namorando um pouquinho. Mas é a realidade, o mundo inteiro não está bonito, está desastroso”, analisa.

Mas a maturidade lhe deu experiência e condições favoráveis para conseguir enxergar o mundo a seu redor sob ótica positiva. “Felizmente, estou ficando velha e já posso pensar nas coisas que eu gosto, que me dão prazer. Me afastar um pouco, escolher com mais rigor o que me interessa e o que não. Eu quero continuar até quando Deus quiser. E eu! (risos) Ah, e o vento, não posso esquecer do vento, ele me comanda”.

Por André Luiz Maia, do Jornal Correio da Paraíba