Governabilidade de Temer tem estabilidade de um castelo de areia

A governabilidade nessa era interina da Presidência da República tem a estabilidade de um castelo de areia na beira da praia. E na hora de a maré encher.

Imaginem o quanto piora a cada segundo sob a força desse tsunami que é a delação premiada do ex-presidente da Transpetro.

Ministros se esparramam pelo chão. Reputações se despedaçam. Quase todos andam de coração na mão à espera de um milagre em meio a denúncias cinematográficas. O milagre é não ser alvo das mangueiras da Lava Jato.

Mas o fato é que Sérgio Machado não poupou ninguém.

Até o presidente em exercício entrou na roda, feito o pai Francisco, tocando o seu violão. E a canção é de refrão travado: não, não, não.

Para Michel Temer, a delação de Machado de que ele, o presidente interino, teria negociado dinheiro de propina para beneficiar um aliado é irresponsável, leviana, mentirosa e criminosa.

Esperamos que seja isso mesmo. Ninguém quer que o vice-presidente escolhido por Lula e pelo PT para emoldurar o brilho de Dilma Rousseff seja um falso brilhante. Bijuteria em fiteiro de rodoviária.

Nesse momento de incerteza, considero métrica adequada à avaliação da pragmática política e social de Michel Temer a observação dos seus atos. Pois também não é isso a pragmática? A praxe da ação em conflito com o discurso?

Pois bem. Está justamente num discurso a essência desse pragmatismo. É um discurso que o presidente interino fez num culto evangélico. Nele, Temer fala de suas relações com o deputado afastado Eduardo Cunha.
Justamente Cunha, inimigo público número 1 da ética na política. O peemedebista forjado nos áureos tempos de Collor presidente, e agora em vias de perder o mandato de deputado federal por não dispor das mínimas condições morais de estar no Congresso Nacional.

“Eu tenho em Eduardo Cunha um auxílio extraordinário na Câmara Federal”. As palavras são de Temer. Que disse mais (a conferir neste link: https://goo.gl/rj0Vls): “Ninguém desconhece as suas qualidades”.

De Norte a Sul, as qualidades de Eduardo Cunha já estão insculpidas entre as mais altas baixarias da República. Qualidades que Temer utilizou, segundo definição do próprio presidente interino, como ajuda extraordinária. Para quê, não se sabe. Certamente foi o tipo de ajuda que Temer precisa agora. Ou não? Resposta nos próximos dias.

Intimidação e má-fé

Em fevereiro de 2008, o jornal “Folha de S. Paulo” publicou sob o título “Intimidação e má-fé” um editorial denunciando o que a opinião pública nacional à época considerou uma prática abusiva.

Vejamos alguns trechos do editorial: ‘Bispos da Igreja Universal do Reino de Deus desencadeiam, contra os jornais “Extra”, “O Globo”, “A Tarde” e esta “Folha”, uma campanha movida pelo sectarismo, pela má-fé e por claro intuito de intimidação. Em dezembro, a “Folha” publicou reportagem da jornalista Elvira Lobato descrevendo as milionárias atividades do bispo Edir Macedo. Logo surgiram, nos mais diversos lugares do país, ações judiciais movidas por adeptos da Igreja Universal que se diziam ofendidos pelo teor da reportagem. (…) Não contentes em submeter a repórter Elvira Lobato a uma impraticável sequência de depoimentos nos mais inacessíveis recantos do país, os bispos se valeram da rede de televisão que possuem para expor a pessoa da jornalista, no afã de criar constrangimentos ao exercício de sua atividade profissional. (…) Na maioria das petições à Justiça, a mesma terminologia, os mesmos argumentos e situações se repetiam numa ladainha postiça. (…) Magistrados notaram rapidamente o primarismo dessa milagrosa multiplicação das petições, condenando a Igreja Universal por litigância de má-fé’.

Pois vejam as voltas que o mundo dá. Na sexta-feira, estava em minha caixa de e-mail uma nota da União Brasileira de Escritores (UBE), da qual reproduzo trechos:

“A UBE – União Brasileira de Escritores vem a público, em defesa da liberdade de expressão, da liberdade de imprensa e do direito à informação, comunicar seu repúdio à atitude dos magistrados e promotores do Paraná que moveram ações judiciais contra cinco dos profissionais do jornal Gazeta do Povo, em reação às reportagens publicadas em fevereiro de 2016 divulgando suas vultuosas remunerações. (…). A UBE acredita que a iniciativa dos magistrados e promotores do Estado é um grave atentado à liberdade de imprensa, revelando nítido caráter de retaliação por parte destes que não só ajuizaram tais processos, como o fizeram em juizados de diversas cidades do Paraná, obrigando os profissionais a percorrerem mais de seis mil quilômetros para comparecer às audiências, prejudicando suas vidas e seus trabalhos.”

Uma atitude sobre a qual proponho uma reflexão neste domingo.

(Reproduzido do jornal A União, edição 19/06/2016)