‘O Quarto de Jack’ é um dos grandes nomes indicados ao Oscar de 2016

Uma experiência cinematográfica intensa. Essa é uma definição apropriada para O Quarto de Jack, filme dirigido pelo irlandês Lenny Abrahamson e que está entre os principais indicados ao Oscar 2016. De agonia, claustrofobia, comoção, ludicidade, frenesi, expectativa e outra gama se sensações latentes, todas são reflexo do enredo e da construção da narrativa – que fez um brilhante trabalho de humanização das personagens. Nos vemos diante de seus dramas, sonhos, alegrias e aspirações, somos arrebatados e completamente imersos no universo delas.

O filme gira em torno da relação entre mãe e filho confinados num pequeno quarto, sem qualquer contato com o mundo exterior. Interpretada pela Brie Larson, numa performance que é a franca favorita ao Oscar de Melhor Atriz, Joy, a mãe, se esforça ao máximo para trazer ao filho referências alegres e constrói com ele um universo paralelo e lúdico dentro do cubículo onde vivem. Vamos percebendo aos poucos a real natureza desse confinamento, à medida em que somos apresentados a rotina da mãe e do pequeno Jack, interpretado primorosamente pelo Jacob Tremblay numa atuação que impressiona pelas nuances dramáticas e pela verdade e naturalidade que transmite.

Brie Larson and Jacob Tremblay star in "Room." (Ruth Hurl/Element Pictures)
A mãe Joy (Brie Larson) e pequeno Jack (Jacob Tremblay) em cena do filme “O Quarto de Jack”. Com os dois confinados num espaço pequeno, ela cria um universo lúdico para livrar o filho do horror da situação em que os dois vivem.

Mãe e filho são mantidos presos no Quarto por um sequestrador. Ela foi sequestrada aos 17 anos e passou 7 como refém; Jack, o filho de cinco anos, nasceu em cativeiro, fruto do abuso sexual que o homem impôs a sua mãe. Toda essa história tem claramente um recorte dramático e cruel, mas há também o esforço comovente da mãe em livrar o filho dos horrores da situação em que eles estão enredados. Essa primeira parte do filme é um tanto claustrofóbica: o espectador fica perturbado com a situação, se vê na posição das personagens; a empatia é imediata, dada a forma como elas se humanizam e se mostram palatáveis, ainda que numa circunstância deveras atípica.

MV5BOTE2MDcwMDMwNl5BMl5BanBnXkFtZTgwNzAxMDY3NjE@._V1_
O pequeno Jacob Tremblay na pele do menino Jack, em cena do filme. A performance dele impressiona pela maturidade cênica. Para muitos críticos, um desempenho tão bom quanto ou melhor que o de atores adultos.

A fuga do cativeiro, arquitetada pela mãe e operada pelo filho pequeno é um dos momentos de maior expectativa, tensão e frenesi que já se viu na Sétima Arte. É de tirar o fôlego, assim como é na mesma proporção comovente e extasiante o reencontro com a mãe já fora do Quarto. Citado desse jeito, como se fosse “O Quarto”, um mundo próprio, o local onde mãe e filho foram confinados é um elemento-chave na narrativa (o título do filme em inglês é apenas Room, quarto em tradução direta), de onde toda a dramaticidade e a construção estética partem. É difícil conseguir esse efeito num espaço cênico restrito, mas a direção conduz a uma visualidade muito bem-disposta no quadro fílmico (com uma providencial colaboração da fotografia e da direção de arte). Consegue até extrair alguma beleza do lugar.

081125.jpg-c_640_360_x-f_jpg-q_x-xxyxx
Interpretando Joy, a mãe sequestrada que cuida do filho e tenta manter a esperança, Brie Larson tem uma performance excepcional em “O Quarto de Jack” é a franca favorita a levar o Oscar 2016 de Melhor Atriz

Além de um filme sobre o amor entre mãe e filho que consegue transpassar o horror e a crueldade, aliado a uma esperança luminosa, é sobre resiliência, sobre se refazer diante da dor. O processo de readaptação de Joy e de Jack não é fácil. Ele não conhecia outro mundo além do Quarto e ela perdeu as referências que tinha: amizades, prospecções, a configuração da família.

Jack, na sua inocência, sua jovialidade, seu olhar infantil e lúdico para o novo, tem algumas resistências no início, mas vai assimilando bem a nova realidade. Já a mãe se sente deslocada a tal ponto, sem rumo ou perspectivas, que chega a cair numa crise emocional profunda. O mundo real se apresenta mais desolador que o Quarto e ela se vê perdida. O reencontro consigo mesma e com a vida que tinha, agora em outro formato que ela não consegue se adaptar, a faz se diluir emocionalmente e entrar em colapso. Novamente o amor do filho é o que a salva.

181297
Mãe e filho livres do cativeiro: o amor dos dois como combustível para recomeçar a vida.

O Quarto de Jack é uma obra que mergulha fundo nos limites da emoção humana, nos faz refletir e gera identificação imediata. A performance esplêndida da Brie Larson, intensa e cadenciada na medida do drama que o filme enseja, junto da do pequeno Jacob Tremblay, que envolve pela maturidade e pela espontaneidade cênica presentes num ator tão jovem, tem muita responsabilidade nisso. É essencialmente um filme de atores, cujas personagens são o eixo central, e que flui bem justamente por extrair performances grandiosas do elenco aliada a uma direção segura. A dor é universal, mas a alegria, o amor, a coragem e a resiliência também – e eles podem salvar uma vida. No fim das contas, esse filme é sobre isso.